A noção de pressão paradigmática pertence à teoria funcionalista do linguista francês André Martinet. A este respeito, no Dicionário de Linguística, de Jean Dubois et al. (São Paulo, Cultrix), lê-se o seguinte:
«Em fonologia geral, A. Martinet avalia o rendimento funcional (função linguística) das diferenças fônicas: partindo da distinção importante entre fatos fonéticos e fatos fonológicos, ele opõe as necessidades da comunicação (exigência de um número máximo de unidades que sejam as mais diferentes possív[el]) e a tendência ao menor esforço (exigência de um número de unidades [o] menos diferentes possív[el]). A tendência a harmonizar essas duas exigências leva à economia na língua ou à melhora do rendimento funcional. Cada unidade do enunciado é submetida a duas pressões contrárias: uma pressão (sintagmática) na cadeia falada, exercida pelas unidades vizinhas, e uma pressão (paradigmática) no sistema, exercida pelas unidades que poderiam figurar no mesmo lugar. A primeira pressão é assimiladora; a segunda, dissimiladora.»
Sendo assim, pode-se considerar que a emergência do sistema de sete vogais do latim vulgar falado nas antigas províncias romanas da Gália e da Hispânia configura uma mudança fónica devida a pressão paradigmática, embora sejam naturalmente de ter em conta pressões sintagmáticas sobre a ocorrência das unidades vocálicas em contexto, entre as quais a relação entre sílabas acentuadas e não acentuadas na palavra ou no sintagma. J. Mattoso Câmara Jr. descreve tal processo do seguinte modo (História e Estrutura da Língua Portuguesa, Rio de Janeiro, Padrão, 1985, págs. 40/41):
«No latim clássico, a quantidade tinha função distintiva: na flexão nominal e verbal distinguiam-se, por exemplo, as desinências -ā de ablativo, e -ă, de nominativo para um mesmo nome, e, entre palavras, havia oposições como — mălum "maçã": mālum "mau", dĭco "consagro" : dīco "digo", cĕras "uma planta" (nom.sing.) : cēras "cera" (ac.pl.), mōlĭs "massa" (gen.sing.) : mōlīs "moinho" (dat. abl. pl.), sŭdis, uma espécie de pau : sŭdis "seco" (dat. abl., pl.).
[...] [A] intensificação do acento destruiu esse delicado jogo quantitativo no latim vulgar. Ao mesmo tempo, as vogais passavam a ser condicionadas pela incidência ou não do acento e, quando átonas, pela sua posição antes ou depois do acento. Assim se eliminou a quantidade como traço vocálico distintivo e se estabeleceram três quadros diversos para as vogais, conforme tônicas, pretônicas ou átonas finais.
No quadro tônico, as dez vogais latinas evoluíram para um quadro triangular de sete vogais: houve confluências e diferenciações que modificaram todo o sistema de oposições latinas.
O dado novo foi o aparecimento de dois graus de elevação da língua em posição intermediária entre a posição baixa (/a/) e alta (/i/, /u/). Com isso, se criou uma oposição distintiva entre um /ɛ/ e /ɔ/ abertos, com pouca elevação da língua, e um /e/ ou /o/ fechados, com maior elevação da língua. O grau médio aberto resultou de /e/ ou /o/ breves, respectivamente; o grau médio fechado foi a confluência das vogais médias longas e das altas breves. Assim só /i/ e /u/ longos, perdendo a sua quantidade distintiva, continuaram como vogais altas.»1
Por outras palavras, no latim, existia um sistema vocálico de cinco unidades vocálicas distribuídas por três graus de abertura, no qual a quantidade era um traço distintivo [ver figura (1)]; mais tarde, o sistema reorganizou-se em quatro graus de abertura, mantendo, criando e neutralizando contrastes [figura (2)]:
(1) ĭ ī ŭ ū
ĕ ē ŏ ō
ă ā
(2) i u
e o
ɛ ɔ
a
1 Por razões técnicas, os símbolos fonéticos originais que representam o e e o o abertos foram substituídos por símbolos correspondentes — [ɛ], [ɔ] —, que se usam em literatura mais recente e fazem parte do Alfabeto Fonético Internacional.