É sempre com muito gosto que recebemos as observações do nosso prezado consulente Carlos Ferreira.
Na resposta que critica, eu disse que não concordava com os gramáticos que consideram existir um tritongo na forma verbal enxaguam e reafirmo essa minha discordância. Sei que conceituados gramáticos brasileiros, como, por exemplo, Evanildo Bechara (pág. 243 da 37.ª ed. da sua Moderna Gramática Portuguesa, 1999), apresentam este verbo acentuado graficamente no Presente do Indicativo e no Presente do Conjuntivo (as pessoas do singular e a terceira pessoa do plural: enxáguo, enxáguas, enxágua, enxáguam; enxágüe, enxágües, enxágüe, enxágüem), mas não filio esta perspectiva e concordo, sim, com a opinião de Napoleão Mendes de Almeida no seu Dicionário de Questões Vernáculas (Edições Ática, São Paulo), que passo a transcrever:
«São comuns na linguagem popular as formas águo, deságua, enxágua e outras semelhantes; há até quem considere serem essas as pronúncias verdadeiras.
É opinião nossa, firmada na doutrina da maioria dos gramáticos modernos, deverem esses verbos ser conjugados como o verbo averiguar, pouco importando pesquisar se o g da terminação guar corresponde a um c ou a um q latino. Será argumento bastante para justificar as pronúncias agúo, desagúa, enxagúo saber que verbo nenhum existe proparoxítono na primeira pessoa do singular do indicativo presente; outra coisa não faremos, seguindo estas pronúncias, senão enquadrar esses verbos nas mesmas leis a que obedecem todos os demais. (...)
«Nos próprios verbos em apreço, quase todos os que pronunciam águo, deságua empregam, para o imperativo da terceira pessoa, o acento paroxítono: agúe – o que denota admitirem igual acento para o subjuntivo presente, caso não constitua esse proceder mera contradição, própria de quem age sem conhecimento pleno.
«Se outros verbos há terminados em uar precedido de g, como averiguar, minguar, apaziguar, que se conjugam com o acento no u nas formas rizotônicas (formas em que o acento cai no radical do verbo e não na desinência pessoal), nada mais justo que proceder de igual maneira com o verbo do verbete [agúa]: eu agúo, aquele rio desagúa, ele enxagúa, agúe as plantas, não enxagúe essa roupa.
«Quanto ao ter consignado o vocabulário da Academia [Brasileira das Letras], de 1943, a acentuação águo para esse verbo, nada temos que dizer, quando o sabemos feito com expansões de pessoalismos. Verifique-se tão-só isto: O vocábulo acrobata aí se encontra com dupla acentuação, a escolha do consulente; o verbo aguar, entretanto, porque sobre sua conjugação o autor do Vocabulário tinha idéias próprias, ou melhor, atinha-se ao que de criança ouvira em sua terra, traz, taxativamente, a conjugação proparoxítona.»
A concluir, prezado consulente, direi que os portugueses, esses, não têm dúvida nem na pronúncia nem na escrita da palavra: enxaguam é uma palavra grave (ou paroxítona), sem qualquer acento gráfico. Quanto ao que se passa no Brasil, como há perspectivas discordantes, permiti-me optar por uma, “não concordando”, portanto, com as outras.