DÚVIDAS

Acerca de posar, novamente

"Pousar" uma achega.
Apesar de consultar o Ciberdúvidas há muito tempo, incrivelmente nunca me havia lembrado de procurar aqui um dos verbos cujos usos mediáticos mais me tem feito rir, ao longo dos últimos tempos: o verbo "posar".
Agora li as respostas sobre este tema,1 e peço que me permitam dar uma achega.
É claro que "posar" e pousar" são verbos diferentes, ainda que relacionados. Habituada, há várias décadas, a usá-los e a distingui-los, vejo mal o se vir a prescindir de um deles. A ideia, compreensível em abstracto, de poupar uma palavra, acrescentando o seu sentido a uma outra já existente, arrepia-me, neste caso. E o argumento do "galicismo" parece-me paupérrimo...
Quanto à pronúncia, vejo plasmadas certas imprecisões. O certo é: «a pose (ó)»; «eu poso (ó)», «tu posas (ó)», «ele posa (ó)»; MAS «nós posamos (u)», «vós posais (u)»; e só agora volta a pronúncia com ó: «eles posam (ó)».
O próprio infinitivo é com "u"!
Verbo “posar” (u), gerúndio “posando” (u), etc.
Tudo se passa como com o verbo "desposar".
Uma vez mais, obrigada.

1 Cf. Ainda sobre posar e pousar + Posar e pousar, outra vez + Posar e pousar

Resposta

Em nome do Ciberdúvidas, agradeço a sua achega.

O que observa faz todo o sentido no português europeu e é o caminho para tornar regular o verbo posar. O que a consulente propõe é que posar siga o modelo do verbo desposar, o qual, por sua vez, se conjuga como chorar, com o aberto quando o acento tónico recai no radical (choro, choras, chora, choram) e com [u], quando o acento tónico se desloca para a sílaba que contém a vogal temática (ch[u]ramos, ch[u]rais).

Mas o facto é que posar é um verbo especial, que se tem usado muitas vezes com o fechado mesmo quando o acento se desloca para as sílabas que se seguem ao radical. Há, portanto, variação na sua pronúncia, havendo uma variante (a que exibe um [o] no radical) que é uma excepção às regras da morfologia e da fonologia do português de Portugal. A variante regular (com alternância [u]/[ó] no radical) terá maior probabilidade de sucesso, mas, como se compreende, não me cabe a mim erigi-la em forma certa ou correcta, porque há que dar igual atenção à história da palavra – que não é assim tão pobre... Assim como pronunciamos narciso com a aberto em sílaba átona, contrariando a regra do vocalismo átono do português europeu (há, pois, palavras com caprichos), também a consideração do percurso de posar, entre o verbo pousar, o nome pose e a possível influência do francês “poser”, me leva a não rejeitar a irregularidade de “pôsar”.

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