A barreira entre os adjetivos qualificativos e os adjetivos relacionais nem sempre é fácil de estabelecer, até porque, ocasionalmente, um adjetivo relacional pode ser usado como qualificativo.
Em relação a vencedor, vale a pena ter em conta que se trata de uma palavra deverbal (e não denominal, como costumam ser os adjetivos relacionais...) que oscila entre uma utilização como nome («O vencedor é o João») e como adjetivo («A equipa vencedora é a azul»). Mesmo quando pode ser interpretado como adjetivo, assume estruturas sintáticas próximas das que encontramos nos nomes, tendo, por exemplo, uma estrutura argumental reflexo da do verbo de que deriva:
1. «A equipa azul venceu a taça.»
2. «A equipa vencedora da taça foi a azul.»
Note-se que esta estrutura é uma das que permitem identificar o complemento do nome, como nos exemplos seguintes:
3. «Construíram um prédio.»
4. «A construção do prédio foi demorada.»
Se compararmos 2 e 4, veremos que o constituinte que desempenha nas frases 1 e 3 a função de complemento direto assume a função de complemento da palavra que deriva do verbo.
Podemos, nestes casos, questionar-nos sobre a real classe da palavra em causa. Será um adjetivo «puro»? Será um nome com um tipo de construção peculiar que lhe permite ocorrer junto de outro nome, como acontece com os nomes de acidentes geográficos (rio Tejo…)?
Por outro lado, se compararmos este adjetivo com outros também deverbais e com o mesmo sufixo, verificamos que há comportamentos distintos. Veja-se, por exemplo, acolhedor (do verbo acolher). Creio que não temos dificuldade em aceitar acolhedor como qualificativo. Mas já teremos dificuldade em o aceitar com valor nominal…
O que se pretende demonstrar é que a classificação exaustiva de uma dada palavra nem sempre se enquadra nas descrições gerais, ou prototípicas, de uma classe ou subclasse de palavras.
Em relação a vencedora, creio que o que impede, de algum modo, a sua flexão em grau é a característica léxico-semântica que a unifica, ou seja, o vencedor é, habitualmente, apenas um, pelo que não tem lógica atribuir-lhe flexão em grau… Se compararmos com acolhedor, já referido, ou com trabalhador, veremos que, com a mesma derivação, outras palavras admitem flexão em grau, mesmo quando se reportam a pessoas, como é o caso de trabalhador.
Em síntese, creio que não deveremos considerar vencedor como um adjetivo relacional, embora tenhamos de admitir que, como adjetivo qualificativo, tem restrições de ocorrência e de flexão, que advêm, essencialmente, das suas características léxico-semânticas.
Todavia, tratando-se de uma palavra com comportamento periférico, só uma profunda investigação, que não cabe no âmbito do Ciberdúvidas, nos poderia, eventualmente, ajudar a esclarecer todas as dúvidas. Assim sendo, é muito provável que continue a haver interpretações distintas. Isso acontece em muitas situações, muitas das quais são já objeto de investigação pormenorizada, outras aguardam investigadores…
Em contexto pedagógico, dada a sua complexidade, vencedora seria uma palavra a não classificar, por exemplo, no ensino básico.