«Almadilha» (texto poético «As Grutas» em Livro Sexto) não figura nos dicionários mais reconhecidos (nem no Dicionário de Morais, nem no de Cândido de Figueiredo, nem no da Academia das Ciências de Lisboa, nem no Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa de José Pedro Machado), do que se infere que tal palavra é uma criação poética de Sophia, realidade-desvio que a própria liberdade literária/artística permite a todo o artista, pois pela arte se acede ao estatuto privilegiado da diferença. Se se estabelecer uma analogia com o que aconteceu com a criação poética usada por Fernando Pessoa no poema «D.Dinis» de Mensagem – “marulho” – misto de mar e de barulho (fórmula que cria e passa um efeito sonoro muito agradável), provocando uma série de sensações, podemos ousar colocar o termo “almadilha” ao mesmo nível, procurando descodificar/desvendar as possíveis leituras que daí poderemos fazer, partindo das associações que tal termo nos evoca. É importante também assinalar que o próprio texto «As Grutas» nos remete para essa ideia da criação de novas palavras, poucas linhas antes do aparecimento de “almadilha” – «Sem dúvida um novo mundo nos pede novas palavras, porém é tão grande o silêncio e tão clara a transparência, que eu muda encosto a minha cara na superfície das águas lisas como um chão.»Sem dúvida que o termo “almadilha” tem de ser lido/interpretado à luz do texto. Não podemos negligenciar a presença de, pelo menos, duas dimensões: por um lado, a do domínio do sonho/onírico ‘vs.’ a do real, assim como a do universo marinho («águas lisas») e do terreno («chão»). A presença desses elementos indicia (e talvez se possa mesmo dizer que legitimiza) algo que remeta para esses universos vários.Caberá, então, ao leitor “ler” as conotações que a polissemia dessa palavra poderá permitir. Por exemplo, se se inferir que esse termo é um misto de um termo de origem árabe almandrilha , que está associado ao mar (armação de pesca) e de armadilha. Um e outro termo apontam para a ideia de rede, de algo dissimulado com que se pretende apanhar algo. Não estará a narradora ela própria presa nas redes do seu sonho ou queira ficar presa nas grutas que lhe permitem mergulhar nas origens? São as liberdades que o texto literário permite!