DÚVIDAS

A função de sujeito e a de predicativo

A propósito da resposta dada à minha consulta pela professora Sandra Duarte Tavares, em 3/1/2008, restou esclarecer, e parece-me ser este o cerne da questão, como decidir qual termo, nas frases apresentadas, deve exercer a função de sujeito e qual a de predicativo. Vejamos: «Consideram-se ganhos econômicos uma indicação de riqueza.» Podemos considerar «uma indicação de riqueza» o sujeito da oração, como se indicou na resposta. Mas por que não «ganhos econômicos»? Nesse caso, poderíamos fazer a seguinte frase: «Ganhos econômicos são considerados uma indicação de riqueza.» Ou esta, usando o verbo ser: «Ganhos econômicos são uma indicação de riqueza.» Na frase com o verbo considerar, a posição dos termos, ambos de valor nominal, a meu ver, não define necessariamente sua função sintática. O que não ocorre com o verbo ser. Assim, na outra frase que apresentei: «Consideram-se as borboletas o maior enigma da natureza», se usarmos o verbo ser, o termo «borboletas» poderá ser sujeito ou predicativo dependendo de vir antes ou depois do verbo: «As borboletas são o maior enigma da natureza»; «O maior enigma da natureza são as borboletas».

Desculpe-me da insistência, mas gostaria que esse ponto fosse esclarecido. Obrigado.

Resposta

A posição que as palavras ocupam na frase define, muitas vezes, a sua função sintáctica. Vejamos os seguintes exemplos:

(1) «O Pedro ama a Maria.»

(2) «A Maria ama o Pedro.»

A expressão nominal «o Pedro» é sujeito em (1) e complemento directo em (2). Sucede o inverso com «a Maria».

Observem-se os próximos exemplos com o verbo ser identificacional:

(3) «A Ana é a directora da empresa.»

(4) «A directora da empresa é a Ana.»

Aparentemente, a expressão nominal «a Ana» seria sujeito em (3) e predicativo do sujeito em (4). No entanto, a análise não é assim tão linear, dado que nem sempre é fácil determinar qual o constituinte que desempenha a função de sujeito e de predicativo.

Quando, na resposta anterior, indiquei como sujeito as expressões nominais «qualquer modalidade de benefício financeiro», «as borboletas» e «uma indicação de riqueza», baseei-me no facto de o mesmo ser a expressão que traduz o conceito mais em evidência (e tendo em conta uma das definições mais tradicionais de sujeito: «a entidade sobre a qual se diz alguma coisa»).

No entanto, sendo o sujeito uma função sintáctica, deve ser identificado através de critérios sintácticos e não semânticos.

Por essa razão, a Gramática da Língua Portuguesa, de Maria Helena Mateus (pág. 545), propõe um teste sintáctico1 para determinar qual é efectivamente o constituinte que desempenha a função de predicativo: O predicativo é a expressão nominal que puder ser substituída pelo pronome demonstrativo invariável -o.

Passo a aplicar este teste em duas das frases que apresentou:

(5) «As borboletas são o maior enigma da natureza, e as ostras também o são.» 

* «O maior enigma da natureza são as borboletas, e a grande preocupação dos cientistas também o são.» 

(6) «Uma indicação de riqueza é considerada ganhos económicos, e uma poupança a longo prazo também o é.»

* «Ganhos económicos são considerados uma indicação de riqueza, e também o são bens futuros.»

Pela aplicação deste teste se comprova que as expressões «as borboletas» e «uma indicação de riqueza» têm a função de sujeito.

No entanto, reitero que, muitas vezes, não há consenso entre os autores a respeito do constituinte que desempenha a função de sujeito e de predicativo, quando ser é um verbo identificacional.

Disponha sempre!

1 «Neste tipo de frases copulativas, a que muitos autores chamam frases identificacionais ou equativas, um dos constituintes comporta-se como predicado e o outro como sujeito.

Assim, só um dos constituintes nominais, o predicado da oração pequena, pode ser substituído pelo demonstrativo invariável -o, como mostra o contraste de gramaticalidade entre (23) e (24):

(23) (a) «A degradação do edifício foi [a causa do desmoronamento], e também o foram as chuvas torrenciais.»

(24) (b) *«A causa do desmoronamento foi [a degradação do edifício], e também o foi o pouco cuidado dos inquilinos.»

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