1. Em primeiro lugar, há que saber que gramáticas se querem ver comparadas
Se:
a) Celso Cunha 1970 — Gramática do Português Contemporâneo (1.ª ed.)
ou
b) Celso Cunha e Lindley Cintra 1984 — Nova Gramática do Português Contemporâneo (1.ª ed.).
Se:
c) Mira Mateus et al. 1984 — Gramática da Língua Portuguesa (1.ª ed.)
ou
d) Mira Mateus el al. 2003 — Gramática da Língua Portuguesa (1.ª ed.)
a) tem como obje{#c|}to de descrição o português do Brasil, apesar de também incluir abonações de autores portugueses.
b), editada e amplamente divulgada em Portugal, conta com a participação de Lindley Cintra em três capítulos.
c) e d) diferem no número de autores e na extensão das áreas a descrever; nos dois casos, maior em d).
a), b) e c) sofreram várias reedições.
2. Passo a ter em conta b) e d).
2.1. Ambas são gramáticas de referência, ou seja, não são gramáticas pedagógicas, nem de divulgação.
Ambas são gramáticas descritivas, apesar de, a partir da leitura dos respectivos prefácios, ser possível assinalar diferentes propósitos.
Em Mateus et al. (2003), explicita-se: «não é uma gramática normativa, ou seja, não é um instrumento que regule o bom uso da língua» (p. 17).
Em Cunha e Cintra (1984), diz-se que houve a intenção de criar uma gramática que servisse de «guia orientador de uma expressão oral e escrita que, para o presente momento da evolução da língua, se pudesse considerar "corre{#c|}ta"» (p. xiii). No primeiro capítulo, explicita-se o que se entende por "corre{#c|}to" e explica-se que «A norma pode variar no seio de uma comunidade ling{#u|u}ística» e que, portanto, «Este conceito de norma, que implica um maior liberalismo gramatical, é o que, em nosso entender, convém adoptarmos (...)». E acrescenta-se: «Com efeito, por cima de todos os critérios de corre{#c|}ção – aplicáveis nuns casos, inaplicáveis noutros – paira o da aceitabilidade social (...)»
2.2. Mateus et al. (2003) absorvem a investigação recente sobre o português e outras línguas, pelo que daqui decorrem as principais diferenças de organização e de conteúdo em relação a Cunha e Cintra (1984).
Mateus et al. (2003) apresentam uma estrutura organizada em função das grandes áreas ling{#u|ü}ísticas: variação ling{#u|ü}ística, pragmática e ling{#u|ü}ística textual, semântica, sintaxe, morfologia, fonologia. No âmbito de cada uma destas áreas, há espaço para explicações, análises e reflexões sobre diferentes fen{#ó|ô}menos em foco, à semelhança do que se passa num artigo ou numa publicação de ling{#u|ü}ística teórica.
Cunha e Cintra (1984) seguem a estrutura de uma gramática tradicional: dão lugar central às classes de palavras (do capítulo 8 ao 17); incluem dois capítulos dedicados a questões de estilística (capítulos 19 e 22); reservam lugar para a notação de regras do regist{#|r}o gráfico (capítulos 4 e 21); nestes e nos restantes capítulos — dedicados à fonética e fonologia, à formação de palavras e à estrutura da frase — o metadiscurso é topicalizado, ou seja, segue-se uma estrutura de inventário de aspectos, temas e subtemas, largamente exemplificados através de abonações de autores literários portugueses, brasileiros e africanos.