Sara Mourato - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara Mourato
Sara Mourato
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Licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em Língua e Cultura Portuguesa – PLE/PL2 pela mesma instituição. Com pós-graduação em Edição de Texto pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, trabalha na área da revisão de texto. Exerce ainda funções como leitora no ISCTE e como revisora e editora do Ciberdúvidas.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

No âmbito de uma tradução de Robert Frost, cheguei à seguinte dúvida:

Qual é a formulação mais correta: «Tanto é o caco p’ra varrer que eu me pergunto se a cúpula do céu terá caído…» ou «Tanto é o caco p’ra varrer que eu me pergunto se a cúpula do céu não terá caído…».

As duas versões parecem ter o mesmo sentido, mas não sei se são ambas possíveis do ponto de vista gramatical.

Grato desde já pela atenção.

Resposta:

Ambas as construções são possíveis. Na interrogativa indireta da segunda frase apresentada pelo consulente ocorre o advérbio de negação não com valor expletivo. Neste caso, o advérbio de negação não deixa de ser operador de negação para ocorrer antes como partícula de realce de uma afirmação.

Note-se que por formas expletivas entendemos aquelas que alargam o discurso, mas não aumentam a informação dada. 

Pergunta:

A palavra "intervisão" existe?

Antecipadamente grato.

Resposta:

Intervisão é um substantivo que não vem atestado em nenhum dos dicionários consultados. Não obstante, pesquisas levadas a cabo na Internet levam-nos a concluir que o substantivo é recente na língua portuguesa e surge associado à área cientifica de neurolinguística. Assim, intervisão consiste numa metodologia empregada em trabalho de equipa e que serve para autoaprendizagem, autoconhecimento, desenvolvimento qualitativo profissional dentro de um grupo.

Pergunta:

O verbo combinar aceita a preposição de no caso «combinar "de" ir à festa com os amigos», ou o correto é «combinar ir à festa com os amigos»?

Obrigada.

Resposta:

O verbo combinar, estando ou não no infinitivo, e seguido de um verbo no infinitivo, não aceita a preposição de. Assim sendo, no exemplo apresentado pela consulente, o correto será dizer «combinar ir à festa com os amigos», sem preposição depois de «combinar» (cf. Winfried Busse, Dicionário Sintatico de Verbos Portugueses, Coimbra, Almedina, 1995; e J. Malaca Casteleiro, Dicionário Gramatical de Verbos Portugueses, Lisboa, Texto Editores, 2007.

Observe-se, contudo, que, em fonte brasileiras (cf. Dicionário Houaiss de Verbos da Língua Portuguesa, Rio de Janeiro, Editora Objetiva, 2003, pág. 274), se regista o uso de combinar com preposição em, antes de infinitivo: «Os doutores combinaram em assinar a pauta» (ibidem, sublinhado nosso; ver também Francisco Fernandes, Dicionário de Verbos e Regimes). Assinale-se, porém, que uma consulta do Corpus do Português (de Mark Davies e Michael Fereira) permite detetar que, em textos do português do Brasil, o verbo combinar também se combina geralmente sem preposição com infinitivo; curiosamente, os dois exemplos de infinitivo preposicionado que ocorrem em textos do Brasil não exibem a preposição em, mas sim a preposição de: «Minha mãe era amiga da bibliotecária e elas combinaram de dizer para as freiras que eu ficaria a semana toda na casa dela [...]»; «[...] nós combinávamos de ir na rua Santa lfigênia [...]. Trata-se de duas ocorrências em textos que parecem estar marcadas pela oralidade e que não se encontram legitimadas pelas obras descritivas e normativas brasileiras a que temos acesso...

Pergunta:

Gostava de saber se têm alguma informação sobre o verdadeiro significado das palavras balcória e paceta.

Obrigado.

Resposta:

Nenhum dos dicionários consultados (Dicionário Houaiss, Aurélio XXI, Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, Dicionário Priberam da Língua Portuguesa) regista os substantivos balcória e paceta. No entanto, podemos afirmar que o primeiro substantivo é um regionalismo da zona centro de Portugal e que significa «mulher desmazelada, de moral duvidosa» (Vítor Fernando Barros, Dicionário de Falares das Beiras, Lisboa, Âncora Editora/Edições Colibri, 2010). Relativamente ao segundo substantivo, paceta, parece corresponder a um nome dado a ferramentas utilizadas na construção civil, com origem numa marca comercial: Pacetta.

Pergunta:

Qual o significado da palavra dendróforo, a páginas 39 da História da Arte em Portugal – O Renascimento e o Maneirismo, Vítor Serrão, Editorial Presença, 2002?

Resposta:

Dendróforo é um «celebrante das dendrofórias que portava ramos de árvores para homenagear os deuses da vegetação» (Dicionário Eletrônico Houaiss, 2001). Quanto a dendrofórias (substantivo feminino plural), estas eram, «na Antiguidade grega, festas em homenagem aos deuses da vegetação» (idem); é palavra constituída pelo elemento dendro-, do grego déndron, ou «árvore», e pelo formante -foria, relacionado com o grego phorá, «ação de levar, de carregar à frente».