Sara Mourato - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara Mourato
Sara Mourato
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Licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em Língua e Cultura Portuguesa – PLE/PL2 pela mesma instituição. Com pós-graduação em Edição de Texto pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, trabalha na área da revisão de texto. Exerce ainda funções como leitora no ISCTE e como revisora e editora do Ciberdúvidas.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Por que se faz uso do futuro numa frase como esta «por que TERÁ acordado tão cedo»?

Resposta:

A construção de ter no futuro seguido do particípio passado do verbo principal denomina-se futuro perfeito do indicativo ou futuro do presente composto. Este tempo verbal utiliza-se para exprimir uma ação futura anterior a outra, também futura (ex.: «Quando chegares, já terei terminado de estudar»), exprimir certeza de uma ação futura (ex.: «Se não te disser nada, é porque já terei saído»), supor factos passados (ex.: «Supõe-se que 200 atletas terão participado na prova») e exprimir dúvidas sobre factos passados (ex.: «Eles terão compreendido?»). Expostos os casos em que se utiliza este tempo verbal, concluímos que o exemplo apresentado pelo consulente é, assim, um claro exemplo de dúvida sobre um facto passado. A frase interrogativa «porque terá ele chegado tão cedo?» tem como finalidade expor uma dúvida sobre um acontecimento que sucedeu no passado. 

Pergunta:

Devemos escrever «afetiva-sexual» ou «afetivo-sexual»?

«Apesar de vivermos numa sociedade mais inclusiva, fala-se pouco da área afetivo-sexual destes jovens.»

Resposta:

Ns adjetivos compostos que pressupõem a coordenação entre dois adjetivos, como é acontece neste caso concreto, que subentende «afetivo e sexual», apenas o segundo elemento varia em género e número, ficando o primeiro invariável. Como o segundo elemento  sexual  é uniforme quanto ao género (tem apenas uma forma para os géneros masculino e feminino), manterá a mesma forma independentemente do género do substantivo que qualifica; assim, o correto é referirmo-nos a uma «área afetivo-sexual». Se tivermos de qualificar um substantivo plural, é também o segundo elemento que recebe a forma de plural: «áreas afetivo-sexuais». Note-se que o mesmo comportamento têm os adjetivos pátrios e compostos que se referem à associação de países, nações ou regiões: «área luso-angolana», «áreas luso-angolanas».

Pergunta:

Os Serviços Municipalizados de Água e Saneamento dos Municípios de Oeiras e Amadora (SIMAS), quando referidos pela abreviatura, deverão ser designados por «o SIMAS», ou «os SIMAS»?

Resposta:

Primeiro, importa referir que SIMAS é acrónimo de Serviços Intermunicipalizados de Água e Saneamento do Municípios de Oeiras e Amadora1. Por acrónimos entendam-se os substantivos formados pelas letras iniciais de várias palavras, tal como as siglas, mas que, ao contrário destas, permitem uma leitura silábica2. Assim, reparamos que estamos perante um acrónimo pouco convencional, porque uma das letras – I – corresponde não a uma palavra autónoma, mas a um prefixo: inter-.

Relativamente à questão colocada, sabendo que o primeiro S de SIMAS corresponde a serviços – substantivo no plural –, então devemos utilizar o artigo masculino plural: «os SIMAS». Note-se que a pluralização do artigo não advém do S no final do acrónimo, que corresponde a saneamento.


1 Veja-se a forma como é denominado no Regulamento de Organização dos Serviços Intermunicipalizados de Água e Saneamento dos Municípios de Oeiras e Amadora, anexo ao Despacho n.º 9265-C/2013 (Diário da República, 2.ª série, n.º 134, 15 de julho de 2013).

2 RTP é uma sigla que nos obriga à leitura letra a letra, e REN, por exemplo, permite-nos uma leitura em sequência como qualquer palavra monossilábica.

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Pergunta:

Porque em Portugal não se usam os verbos no gerúndio?

Resposta:

Não é correto afirmar que em Portugal não se usam os verbos no gerúndio. Apesar de não ser tão comum comparativamente ao uso no português do Brasil, o gerúndio é utilizado em português europeu, nos chamados dialetos centro-meridionais (principalmente nas regiões do Alentejo e Algarve) e nos dialetos insulares (arquipélagos da Madeira e Açores). Em alternativa, é mais comum o uso do infinitivo – «Lá foram eles, a correr e a cantar», em oposição a «Lá foram eles, correndo e cantando» –, ou ainda o uso da construção estar/andar/vir/ir a + verbo no infinitivo – «Estou a comer», em vez de «Estou comendo».

Neste último caso, o uso dos diferentes verbos pode dar significados diferentes ao enunciado. Assim, se o verbo auxiliar for o verbo estar, a construção perifrástica indica uma ação durativa que decorre num momento específico (ex.: «Ele estava a estudar/estudando, hoje de manhã»). Se, por outro lado, utilizarmos o verbo auxiliar andar, a ação continua a ser durativa, mas predomina a ideia de movimento (ex.: «Ela anda a ler/lendo sempre o mesmo livro»). Na construção perifrástica com o verbo vir constrói-se uma ação durativa que se desenvolve gradualmente em direção ao momento ou ao espaço onde nos encontramos (ex.: «Olha quem vem a chegar/chegando!»). Por fim, se a construção tiver como auxiliar o verbo ir, tem-se a ideia de duração, de uma ação que se prolonga no tempo, realizando-se progressivamente por etapas sucessivas (ex.: «Vou ver/vendo o que acontece»).

Pergunta:

«Aulas avulso», ou «aulas avulsas»?

Obrigada.

Resposta:

Avulso é um adjetivo de dois géneros pluralizável (avulso/a, avulsos/as). Como tal, deve concordar em género e em número com o substantivo correspondente. Neste exemplo concreto, o correto será: «aulas avulsas».