Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Qual é a origem do sobrenome/apelido Parente?

Resposta:

O apelido/sobrenome Parente tem origem no substantivo masculino parente. Segundo José Pedro Machado (Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa), também existiu um patronímico, atestado desde o século X, e que também se tornou apelido/sobrenome Parentes.

Pergunta:

Qual é a origem do sobrenome/apelido Fernandes?

Resposta:

É um apelido/sobrenome que tem origem no patronímico Fernandez ou Fernandiz, derivado de Fernando.

Pergunta:

Verifiquei que em resposta anterior foi esclarecido que a origem da palavra circuncisão viria do verbo circuncidar. É verdade que a maioria ou até totalidade dos dicionários concorda. No entanto, gostaria de saber se não concordam que o verbo correcto seria "circuncindir", dado que cisão vem do verbo cindir e, de facto, circuncisão é o acto de cindir à roda de....

Muito obrigado e parabéns pelo vosso trabalho que descobri através da Antena 2.

Resposta:

O que afirmo nessa resposta é que o substantivo circuncisão está em relação com o verbo circuncidar do ponto de vista morfológico, isto é, da forma das palavras. Mas é também necessário saber que circuncisão tem origem no latim circuncisĭo,ōnis, «diminuição, supressão», cujo radical deve ser o mesmo do supino circumcisum do verbo circumcīdo,is,di, sum,dĕre, «cortar ao redor, cercear, decotar, amputar, aparar, podar, circuncidar», de acordo com o que se lê no Dicionário Houaiss; este sugere ainda que «a mudança de conjugação do latim para o português talvez tenha sido por influência do verbo dar». É de realçar, porém, que o radical cis- de circumcidĕre é uma variante do verbo latino caedo,is,cecĭdi,caesum,caedĕre, «como termo rural, "talhar, podar, cortar (árvores), deitar abaixo (cortando)", depois "entalhar"; como termo militar, "desbaratar (um exército)"; "ferir com instrumento cortante, imolar, sacrificar; ferir mortalmente, matar"» (Dicionário  Houaiss).

Quanto a cisão, é a adaptação ou a evolução da palavra scissio,ōnis, «fenda, rachadura, rompimento», cujo radical é scissum, «supino de scindĕre "fender, romper, rachar, partir, cortar, talhar"»; o referido dicionário ainda considera que «talvez a redução do -ss- do étimo latino a -s- se deva à influência de palavras como decisão, incisão, compostas de caedĕre, "cortar", radical semanticamente aparentado».

Em conclusão, há relação entre circuncisão e cisão, sim, mas trata-se de palavras que se ligam por via etimológica, que não morfológica. Por conseguinte, "circuncidir" não é forma mais correcta que circuncidar, ...

Pergunta:

Segundo a Mordebe, as palavras "setorizar" e "setorização" não são aconselháveis em Portugal após a entrada em vigor do Acordo Ortográfico. Apreciaria que confirmassem esta informação, tendo a bondade de ver a "Lista de todas as palavras que mudam".

Muito obrigado.

Resposta:

Assim é realmente. As palavras em referência continuarão a escrever-se com c, porque esta letra é pronunciada: se[k]torizar e se[k]torização (cf. dicionário da Academia das Ciências de Lisboa e Grande Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora). No Brasil, escreve-se e escrever-se-á setorizar e setorização.

Assinale-se que as palavras sector e sectorial continuarão a ser escritas também com c em português europeu, embora a sua pronúncia possa variar, segundo o Grande Dicionário da Língua Portuguesa: se[kt]or vs. se[t]or; se[kt]orial vs. se[t]orial. No Brasil, mantêm-se as grafias e as pronúncias setor e setorial.

Pergunta:

A expressão "cavidades escavadas" é considerada um pleonasmo? E como descobrir, no caso mais genérico, se uma expressão é um pleonasmo? Através da etimologia das palavras?

Resposta:

O pleonasmo é identificado pelo significado das palavras: «exéquias fúnebres» é um pleonasmo, porque a definição de exéquias já abrange a significação de fúnebre, ou, por outras palavras, é irrelevante empregar o adjectivo fúnebre com exéquias. Em relação a palavras com o mesmo radical, a sua associação é geralmente pleonástica: «um elemento visual à vista» é um pleonasmo.

A respeito de cavidade, de escavar e do feminino do particípio passado deste, escavada, eu diria que a sua associação não é propriamente um pleonasmo mas antes um ilogismo, porque, a rigor, não se «escava uma cavidade». De facto, escava-se um terreno ou uma árvore, e o resultado é a cavidade que se abriu (cf. Dicionário Houaiss). Diga-se, portanto, «terreno escavado» e «cavidade» ou «cavidade aberta».