Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Gostaria de saber qual a origem dos apelidos Relvas e Lourenço.

Grata.

Resposta:

A informação que se segue é a que se disponibiliza em José Pedro Machado, Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa:

Relvas

Antiga alcunha, talvez derivada do topónimo Relvas, que tem origem no uso do plural de relva como descrição de um lugar onde se encontra relva. Convém lembrar que muitos apelidos remontam a nomes de localidades: Braga, Macedo, Viana, Almeida, etc.

Lourenço

É nome próprio que passou a ser usado como apelido, desde a Idade Média (por exemplo, Pedro Lourenço). O nome Lourenço provém «do lat. Laurentiu-, inicialmente adj., «natural de Laurento».

Pergunta:

«Incentivar a leitura», ou «incentivar à leitura»?

Obrigado.

Resposta:

As duas maneiras são possíveis. Segundo o Dicionário Houaiss, incentivar é verbo transitivo quer directo quer indirecto:

1. «dar incentivo a; despertar o ânimo, o interesse, o brio de; encorajar, estimular, incitar. Ex.: "i. jovens artistas"; "o sucesso incentivou-os (a trabalhar)"»

2. «empenhar-se para que (algo) seja criado, realizado ou intensificado; impulsionar, promover. Ex.: "um governante que sempre incentivou o progresso"»

3. «criar ânimo ou vontade de; decidir-se a. Ex.: "vendo a irmã em apuros, incentivou-se a entrar na briga"; "depois das aulas de literatura, os alunos incentivaram-se a ler Machado de Assis"»

Sendo assim, de acordo com a acepção 2, pode dizer «incentivar a leitura», e, conforme a acepção 1, pode também dizer «incentivar (alguém) a ler» ou, usando o substantivo que se relaciona com o verbo ler, «incentivar (alguém) à leitura».

Pergunta:

Numa pequena pesquisa online verifiquei que tanto surge «J. P. é delegado do Partido X ao Congresso do Campo», como «J. P. é delegado do Partido X no Congresso do Campo». Qual das duas opções é a correcta? Na minha opinião, parece-me ser a segunda, mas não tenho a certeza.

Obrigada, desde já, pela ajuda.

Resposta:

Pode dizer «o delegado do Partido X ao Congresso do Campo» e «o delegado do Partido X no Congresso do Campo».

O verbo relacionado com o substantivo delegado, delegar, não tem regência com a preposição a, mas admite um adjunto adverbial com valor de finalidade ou direcção, introduzido por para: «o Partido X delegou alguém para o Congresso...» Paralelamente, pode-se recorrer a uma construção que inclua «no Congresso...», também com a função de adjunto adverbial: «o Partido X delegou poderes em alguém no Congresso.»

De qualquer modo, a regência com a encontra-se atestada no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa: «Já foram designados os delegados ao Congresso.» É provável que este uso tenha sido favorecido pela sinonímia com enviado, que, enquanto substantivo, tem regência com a preposição a, à semelhança do verbo relacionado, enviar, que selecciona a mesma preposição: «J. P. é enviado do Partido X ao Congresso...»/«J. P. foi enviado pelo Partido X ao Congresso...»

Pergunta:

Voltaria a uma questão já por mim posta.

Em torno do tema da "ocularidade".

O Iluminismo é predominantemente "ocular". A bibliografia em língua inglesa usa "ocularcentrism". Pretendo seguir um termo próximo do inglês: logo, escrevo ocularcêntrico, ou ocular-cêntrico?

Resposta:

Escreva ocularcêntrico, sem hífen, tal como se escreve egocêntrico, antropocêntrico, teocêntrico ou etnocêntrico. Queria, no entanto, observar que a palavra é simples adaptação do inglês ocularcentric, termo usado pelo filósofo Jay Martin para designar o enviesamento do pensamento moderno ocidental para considerar o conhecimento como visual e visto. Noto, contudo, que ocularcêntrico é uma forma estranha em português, porque o elemento que precede -cêntrico termina geralmente em -o: ego-, antropo-, teo- e etno-. Deste modo, parece-me mais bem formado o termo oculocêntrico, porque recorre ao antepositivo ocul(o)-, que é a forma adoptada pelo radical de ocular em palavras compostas eruditas; por exemplo: oculofacial e oculomotor (cf. Dicionário Houaiss).

Pergunta:

Na frase que se segue — «A ideia de natureza, que tomo de empréstimo de um dos grandes filósofos do século XVIII, Kant...» — , a forma correcta é «tomo de empréstimo de», ou será «tomo de empréstimo a»? Ou é preferível a expressão «tomo emprestado de/a»?

Obrigado pelo excelente serviço que prestam a todos nós, isto é, à língua portuguesa.

Resposta:

As duas preposições estão correctas. Tomar, no sentido de «pedir emprestado», é usado quer com a preposição de quer com a, como indica e atesta o Dicionário Houaiss: «Vive tomando dinheiro aos/dos amigos.»

Quanto a «tomar de empréstimo» vs. «tomar emprestado», são duas expressões verbais também aceitáveis, com significado próximo de «pedir emprestado», que podem combinar-se com as regências referidas: «tomar de empréstimo a/de»; «tomar emprestado a/de».

Uma observação: se «tomar alguma coisa de/a» já quer dizer «pedir emprestado», poderá achar-se que «tomar de empréstimo/emprestado de/a» é redundante. No entanto, dada a polissemia (diferentes significados) de tomar, convém especificar a forma como se toma — no caso, «de empréstimo» ou «emprestado».