Pergunta:
Reconhecendo a maior utilidade deste espaço de esclarecimento dedicado à língua portuguesa, gostaria de manifestar, desde já, o meu agradecimento pela atenção que possa merecer a questão que passo a colocar.
Vi, recentemente, serem aplicados os fenómenos fonéticos seguintes:
primarium < primariu — apócope do fonema "m";
primariu < primairu — metátese do grupo "ri" para "ir";
primairu < primeiro — assimilação do "a" para "e".
Quanto à queda e à transposição de fonemas, encontram-se as mesmas de acordo com os ensinamentos adquiridos. Já quanto à "assimilação" não nos parece correcta a sua aplicação, porquanto tal definição implica que a transformação de um fonema o seja noutro igual ou semelhante a um que lhe seja contíguo e dentro da mesma palavra, tal como ocorre, por exemplo, em ipsum < isso, onde o "p" se assemelhou ao "s".
Solicito, pois, o favor de me esclarecerem sobre a alteração ocorrida em "a" para "e", no caso supra apresentado.
Reiterando agradecimentos e formulando os melhores votos para a prossecução de tão meritório trabalho, apresento os melhores cumprimentos.
Resposta:
Por assimilação, entende-se um «processo fonológico em que um segmento fonético se identifica com um segmento vizinho ou dele se aproxima, ao adquirir um traço ou traços fonéticos desse segmento vizinho».
O termo assimilação aplica-se ao caso de [a] > [e] em primeiro, porque o segmento [a] perde o traço [+ recuado], passando a [-recuado] como [i], que lhe é contíguo. O resultado é [e], vogal menos [-recuada]. Dito de outro modo, o [a] passa a [e], porque se fecha em contacto com o [i], ou seja, assemelha-se ao [i], que é vogal fechada, em terminologia tradicional.
Note que estamos a falar de um processo de evolução fonética que deu origem ao ditongo [ej], que ainda hoje se ouve ao pronunciar-se primeiro em certos dialectos do português contemporâneo. Contudo, no português europeu-padrão, tal ditongo evoluiu no sentido de uma diferenciação dos seus elementos. É assim que se explica que se diga "primâiru" (em transcrição fonética: [pɾimɐjɾu]) nessa variedade do português.