Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Sempre utilizei o verbo rir conjugado reflexamente, como, por exemplo, na frase: «riram-se a bandeiras despregadas». Porém, já o tenho visto conjugado sem o pronome, desde logo: «riram a bandeiras despregadas». A minha pergunta é: qual das formas é a correta?

Obrigado.

Resposta:

Assim como usa rir e rir-se, com significados próximos, sendo mais enfática a forma com pronome reflexo, também pode usar «rir a bandeiras despregadas» ou «rir-se a bandeiras despregadas».

Pergunta:

Qual a melhor tradução para newsmakers?

Resposta:

Não parece existir ainda palavra ou expressão equivalentes ao anglicismo newsmaker. Encontro só o literal «fazedor de notícias». Assim se pode interpretar a palavra no artigo de Paulo Serra, O on-line nas fronteiras do jornalismo: uma reflexão a partir do tabloidismo.net de Matt Drudge:

«[...] Doug Harbrecht, presidente do National Press Club à época em que Drudge foi convidado a proferir um discurso naquela instituição, considera este não só como um newsmaker mas também como o iniciador de uma “revolução” no jornalismo [...].»

O anglicismo também se refere a qualquer pessoa ou coisa susceptíveis de serem notícia.

Pergunta:

Gostaria de saber o significado dos vocábulos lógica, dialéctica, gramática e retórica – e também de oratória. O que compreendiam estas áreas no período medieval, dentro do contexto das artes liberais? Qual seu uso moderno? Eles mantêm alguma relação com as mesmas áreas de hoje e também entre si? A gramática utiliza-se da lógica, retórica, dialéctica ou oratória em suas estruturas? Há alguma referência bibliográfica sobre a relação destas áreas com a gramática?

Agradeço antecipadamente o auxílio.

Resposta:

A pergunta feita revela ambições que não se inscrevem no formato das respostas que são habituais no Ciberdúvidas, porque tem carácter enciclopédico, isto é, refere-se mais à história e ao contexto cultural das palavras em apreço do que estritamente ao seu significado linguístico no conjunto do léxico português. Mesmo assim, procurarei dar umas breves pistas acerca de como se concebiam as disciplinas em questão na Idade Média (ou, melhor, por volta dos séculos XII e XIII, quando florescem as universidades). Quanto à definição destes termos na atualidade, remeto o consulente para as respostas indicadas mais abaixo, em Textos Relacionados.

Comece-se por dizer que a gramática (da língua latina), a retórica e a dialética, que abrangia a lógica, constituíam o chamado trīvium (aportuguesando, trívio) das sete artes liberais do ensino universitário medieval (as outras quatro, ou seja, a música, a aritmética, a geometria e a astronomia, formavam o quadrīvium) – cf., segundo R. H. Robins, A Short History of Linguistics (Londres e Nova Iorque, Longman, 1997, pág. 82)1. Como observa M.ª do Céu Nogueira (s. v. "artes liberais", Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura Verbo), «[d]urante a escolástica, as artes, o septívio [= as sete artes liberais], não foram estudadas por si mesmas: eram vias de acesso à Sagrada Escritura».

1. gramática

Na Idade Média, o conceito de gramática parece não se afastar muito do da tradição clássica grega e latina. Sobre a história e conceito de gramática, J. G. Herculano de Carvalho anota o seguinte (s. v. "gramática", ...

Pergunta:

Anteriormente enviei uma dúvida com o seguinte texto:

«Gostaria de saber se há algum critério seguro e bem aceito na língua portuguesa para diferenciar uma oração relativa livre de uma subordinada interrogativa. Minha dúvida é motivada pelo fato de que, ao que parece, uma interrogativa subordina é possível ser introduzida por preposição: “perguntou de quem era o vestido”, o que já não parece possível com uma relativa livre:*"conhece de quem era o vestido”. No entanto, o que me parece é que o que permite tal distinção seria o próprio significado relacionado ao verbo da oração principal. No entanto, eu fico em dúvidas numa frase como esta: “Imagino de quem ela falou.” Não sei se ela pode ou não ser considerada gramatical. Um critério que eu, a partir de algumas poucas leituras sobre assunto, tenho estipulado é o seguinte: substituir o pronome relativo livre por algum demonstrativo acompanhando de seu pronome relativo, se resultar agramatical ou se o sentido diferir bastante, tal oração então seria interrogativa, caso contrário, seria uma oração relativa livre. Ex. “Imagino quem entrou na sala” – ?“Imagino aquele que entrou na sala”. Esta última, além de soar um pouco esquisita, muda bastante o sentido da frase. Logo, parecer-me-ia que estamos diante de uma construção cuja subordinada é uma interrogativa indireta. A partir desses argumentos – os quais coloco em dúvida - não me pareceria absurda uma frase como a que eu mencionei anteriormente: “imagino de quem ela falou”, uma vez que por este critério – o qual não sei se pode ser válido – tal oração seria uma subordinada interrogativa, a qual poderia ser introduzida por preposição. Como eu tenho acompanhando algumas respostas de Carlos Rocha a perguntas sobre o tema, gostaria, se possível, que ele comentasse sobre minhas indagações. No entanto, deixo livre para fazê-lo qualquer consultor que tenha interesse.»

No ent...

Resposta:

O critério proposto parece seguro desde que se tenha em conta que tal preposição faz sempre parte da regência do verbo da oração subordinada relativa livre. Por outro lado, a compatibilidade ou incompatibilidade resultam efetivamente da semântica do verbo que seleciona a oração.

Assim, quanto ao verbo imaginar, já aqui se comentaram as suas propriedades semânticas: como sinónimo de adivinhar, permite que uma oração introduzida por quem preposicionado seja interpretada como interrogativa indireta: «Imagino quem entrou na sala»; «Imagino de quem ela falou». Já como equivalente a visualizar, a oração é interpretada como relativa livre, e a frase deixa de ser aceitável — a não ser que substitua quem por uma construção de antecedente e que ou quem preposicionado: «Imagino aquele que entrou na sala»; «Imagino aquele de quem ela falou».

O que Virgílio Dias (V. D.) põe em causa é apenas a aplicação do termo «predicativo do sujeito» a um dado constituinte sintáctico, e não a existência deste. A questão é, portanto, de natureza terminológica, porque não vejo diferença entre a análise que V. D. faz das várias frases que apresenta e as que, tendo por objecto as mesmas frases, podem decorrer da gramática tradicional ou de certas abordagens da investigação linguística.