Pergunta:
Nas frases «Eu tenho o cabelo molhado» e «O carro tem o pneu furado», qual a função sintática desempenhada por molhado e furado?
Eu entendo que será o nome predicativo do complemento direto, apesar de o verbo ter não pertencer à lista dos verbos que exigem PCD. No entanto, as frases tornam-se agramaticais sem este constituinte.
Resposta:
Trata-se efetivamente de um predicativo do complemento direto.
Note-se, contudo, que a agramaticalidade decorrente da supressão deste predicativo advém do facto de o verbo ter ocorrer numa construção resultativa (ter alguém, alguma coisa + particípio passado). Por outras palavras, a presença de um verbo numa lista de itens com determinado comportamento sintático não impede que esse mesmo verbo apareça noutras estruturas, associado a outros valores semânticos, podendo, por isso, pertencer a outros elencos.
Assinale-se que Inês Duarte e Fátima Oliveira se referem a essa construção com particípio passado ("Particípios resultativos", XXV Encontro Nacional da Associação Portuguesa de Linguística, pp. 397-408):
Num estudo sobre o particípio passado em português (Marcin Wlodek, "O particípio português — formas e usos", in Romansk Forum, n.º 17, 2003, pp. 43-53), descreve-se esta estrutura, também selecionada por outros verbos:
[...] o particípio é muito usado como elemento predicativo ligado ao complemento directo dos verbos ter, trazer, levar e deixar. Nestes casos focaliza-se o estado atribuído ao complemento mediante um particípio que concorda com este em género e número: