Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

«Sendo assim» é uma conjunção? Como poderia classificar?

Resposta:

Na perspetiva da terminologia da gramática tradicional, o dicionário da Academia das Ciências de Lisboa (ACL) regista a expressão «sendo assim» como locução conjuncional e equivalente a «assim sendo», também classificada como uma locução conjuncional. No entanto, em Portugal, com a adoção do Dicionário Terminológico (DT) no ensino básico e secundário, pode-se também classificar a expressão «sendo assim» (como «assim sendo») como um conetor discursivo, semanticamente afim de portanto, que é igualmente um conetor discursivo com valor conclusivo ou explicativo (cf. dicionário da ACL e DT, C.1.1. Comunicação e interação discursivas).

Pergunta:

A vossa resposta 12466 sobre o uso de maiúsculas em palavras compostas parece-me bastante elucidativa. No entanto, gostaria que me esclarecessem sobre um caso em particular: que acontece quando o emprego da maiúscula se deve não à palavra composta em si mesma, mas à sua colocação na frase? Exemplificando, julgo que deve escrever-se: «Conheço um contra-almirante. Contra-almirante esse que enjoa no mar.» Ou será que o correcto é (a seguir ao ponto final) «Contra-Almirante», em vez de «Contra-almirante»?

Obrigado.

Resposta:

A resposta é simples: só há maiúscula na primeira letra do primeiro elemento da palavra composta. Escreva-se, portanto, depois de ponto, «Contra-almirante», como o próprio consulente apresenta ou como ocorre no seguinte exemplo, com a palavra contra-almirante (nos exemplos facultados, no plural):

«Conheço vários contra-almirantes. Contra-almirantes não faltam.» 

N.E. [24/04/2014] – São estas as regras do uso das minúsculas e das maiúsculas, estipuladas no Acordo Ortográfico de 1990 (Base XIX):  

 

DAS MINÚSCULAS E MAIÚSCULAS

1 A letra minúscula inicial é usada:

a) Ordinariamente, em todos os vocábulos da língua nos usos correntes.

b) Nos nomes dos dias, meses, estações do ano: segunda-feira; outubro; primavera.

c) Nos bibliónimos/bibliônimos (após o primeiro elemento, que é com maiúscula, os demais vocábulos podem ser escritos com minúscula, salvo nos nomes próprios nele contidos, tudo em grifo): O Senhor do Paço de Ninães, O Senhor do paço de Ninães, Menino de Engenho, Menino de engenho, Árvore e Tambor ou Árvore e tambor.

d) Nos usos de fulano, sicrano, beltrano.

e) Nos pontos cardeais (mas não nas su...

Pergunta:

Que testes nos permitem ter a certeza se estamos perante um complemento do nome ou um modificador restritivo do nome?

Resposta:

Infelizmente não existem testes 100% seguros para fazer a distinção em apreço. Começo por dizer que tanto complementos como adjuntos são opcionais (cf. Adeilson Pinheiro Sedrins, "A estrutura do sintagma nominal e as propriedades sintáticas de distinção das funções de adjunto e complemento do nome", in Clemilton Lopes Pinheiro, Ensaios sobre Língua e Literatura, Maceió, Edufal, 2006, págs. 11-62), o que torna a tarefa de os distinguir mais difícil do que acontece com a identificação de complementos verbais. Por exemplo, recorre-se muitas vezes ao teste da omissão de constituinte para mostrar que um complemento verbal não pode ser suprimido sem afetar o sentido global da frase: assim, em «ele fez um filme», o constituinte «um filme» é complemento verbal, pois a sua omissão produz uma frase agramatical (*«ele fez»). Não é isto que se verifica com o complemento do nome: perante a frase «a construção do edifício foi embargada», é possível omitir o complemento «do edifício» e obter uma frase gramatical (OK «a construção foi embargada»).

Dito isto, convém dizer que podemos identificar o complemento do nome com base nas suas propriedades e, para isso, recomendo a leitura da resposta "O complemento e o modificador restritivo do nome", de Edite Prada. Quanto a testes de identificação, nalguns estudos de sintaxe também se aceitam critérios mínimos que podem, no entanto, deparar-se com exceções (Sedrins, op.cit, pág. 43):

1. Ordem:

Um jogador de futebol do Benfica

*Um jogador de Benfica de futebol

um estudante de linguística da Universidade de Lisboa

*um estudante da Universidade de Lisboa de linguística

2. Os complementos não con...

Pergunta:

Qual a pronúncia correta de remorso? No singular da palavra, o primeiro "o" lê-se aberto ou fechado?

Obrigada.

Resposta:

A pronúncia mais generalizada e considerada mais correta de remorso tem o aberto na penúltima sílaba: "remórso" (cf. transcrições fonéticas [Rɨˈmɔɾsu], no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, e [Rəˈmɔɾsu], no Grande Dicionário da Língua Portuguesa, bem como registo áudio de pronúncia, no Aulete Digital).

Pergunta:

Estou a rever a minha dissertação de mestrado e gostaria de colocar uma questão sobre a utilização de maiúsculas na primeira letra das designações dos conceitos, em português pré e pós acordo ortográfico.

Devo referir que li os tópicos que encontrei associados a esta questão no site, não tendo encontrado resposta específica a esta questão. Também devo referir que não sei se a minha questão tem regras claras de redação em língua portuguesa, ou especificamente no mundo académico e universitário.

Apenas para contextualizar minimamente, refiro que a minha dissertação está relacionada com a Gestão do Conhecimento nas organizações. Para expor devidamente a minha questão estruturei-a pelas seguintes observações e dúvidas:

1- Existem variados conceitos da área de GC (como em qualquer área) que fui buscar à literatura existente, normalmente em inglês: «Best Practices», «Lessons Learned», «Communities of Pratice».

2- Ao traduzir para português, algumas designações têm uma tradução imediata e a utilização de maiúsculas é bastante transparente:

Ex. Best Pratices (BP) -< Melhores Práticas (MP), Lessons Learned (LL) -< Lições Aprendidas (LA)

3- Existem, no entanto, algumas designações que incluem artigos definidos (de/do/da/dos/das), em que a utilização de maiúsculas na sua tradução é também transparente, ou pelo menos, “aceitável”:

Ex. Communities of Pratice (CoP) -< Comunidades de Prática (CdP)

4- A 1.ª parte da minha questão é se, ao expor um conceito cuja designação consiste numa só palavra, como por exemplo, innovation, se devo redigir a prime...

Resposta:

Para os casos de siglas apontados pelo consulente, não encontro normas oficiais ou práticas generalizadas em Portugal. Tradicionalmente, as siglas não incluem palavras de pequeno corpo como artigos, preposições e conjunções (o mesmo acontece em espanhol, conforme se lê no Diccionario Panhispánico de Dudas da Real Academia Espanhola). Por outro lado, do uso de maiúsculas nas siglas não se deduz necessariamente o uso de maiúsculas iniciais nas expressões que assim são abreviadas. Por exemplo, para os termos que não designam instituições mas, sim, conceitos ou realidades físicas, a expressão correspondente à sigla não tem maiúsculas iniciais:

ADN: ácido desoxirribonucleico1

Contudo, o livro  de estilo do jornal português Público indica o seguinte:

«É possível formar siglas de designações gerais como PIB (produto interno bruto) e ONG (organizações não governamentais), por razões de espaço.»

Nesta passagem, verifica-se que o procedimento indicado para a formação de siglas relativas a realidades não institucionais é recorrer às maiúsculas iniciais na escrita da sigla, enquanto se escrevem com minúsculas iniciais as expressões correspondentes:

«