Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

«Trocar por notas de cem», ou «Trocar em cem-cem»?

Grato.

Resposta:

Em Portugal, diz-se «trocar por notas de cem», mesmo informalmente, o que não invalida que, em Angola, na linguagem popular, se diga «trocar em cem-cem». No entanto, noutros contextos, por exemplo, no registo mais corrente ou formal, ou até mesmo perante falantes de outras variedades do português (a do Brasil, a de Portugal, a de Moçambique, etc.), convém recorrer à expressão mais neutra — «trocar por notas de cem» —, de modo a facilitar a comunicação. De qualquer modo, fica aqui feito o registo deste uso angolano.

Pergunta:

Como devo fazer a análise sintática da frase «Quem foi Picasso?»?

Resposta:

Considerando que a resposta à frase interrogativa em questão é «Picasso foi x», entendendo por "x" o que se predica acerca do sujeito, ou seja, o predicativo do sujeito, tal como acontece com a expressão sublinhada em «Picasso foi um grande pintor», a análise a fazer é a seguinte:

«Picasso»: sujeito

«é quem»: predicado

«quem»: predicativo do sujeito

Pergunta:

Desde já quero agradecer-vos o enorme contributo que dão no ensino e para o conhecimento da língua portuguesa. Professores que como eu se encontram isolados num país onde os recursos na língua de Camões são poucos, o acesso à Internet é a nossa melhor opção.

Quanto à minha dúvida, prende-se esta com a palavra géiser/gêiser. A vossa resposta 19638 diz o seguinte: «A forma gêiser é o aportuguesamento da palavra inglesa geyser, que tem origem no islandês geysir, "poço que jorra" (do verbo islandês geysa, "ir para a frente; jorrar"). A pronúncia indicada no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa é [`Ʒɐjzɛɾ], ou seja, "jêiser", com ditongo ei na primeira sílaba e e aberto na segunda (o acento tónico recai na primeira sílaba).»

Nos dicionários de português a que tenho acesso na Internet aparecem as seguintes descrições:

Infopédia (dicionários da Porto Editora): «Gêiser — do islandês geysir, "idem", pelo alemão Geiser, "idem"»;

Priberam: «Géisir — inglês geyser, do islandês Geysir. Grafia no Brasil: gêiser

Também estranho a descrição dada pelo Ciberdúvidas porque a palavra islandesa para «poço que jorra» é goshver, e a palavra geyser deriva do verbo að gjósa´, que quer dizer, entre outros, «jorrar, brotar, esguichar» e «entrar em erupção». Em islandês, a palavra pronuncia-se "gueizér", sendo o guei do início da palavra lido como em gueixa.

Gostaria se possível que me dessem uma descrição mais pormenorizada de como a palavra entrou n...

Resposta:

Em nome do Ciberdúvidas, agradeço as palavras iniciais.

Em português, aceita-se a forma geyser, pronunciada "gáizer", próxima da atribuída ao inglês americano, embora exista um aportuguesamento, gêiser, que soa "jêizer" (cf. Dicionário Houaiss e transcrição fonética das respetivas entradas no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa).1 Parece muito pouco provável que geyser/gêiser provenha diretamente do islandês; o mais plausível é o termo ter chegado ao português por via do inglês, eventualmente pelo alemão, como sugere o Dicionário da Língua Portuguesa da Infopédia — e, já agora, porque não pelo francês? Quem sabe se foram estas três línguas ao mesmo tempo, por intermédio dos livros que chegavam a Portugal ou ao Brasil, que contribuíram para a adoção da palavra em traduções? Não obstante, o facto de a palavra estar atestada pela primeira vez em 1838 (cf. Dicionário Houaiss), numa época (o século XIX) em que o francês atuava como língua de divulgação científica para muitas outras, leva-me a não descartar a hipótese de uma transmissão francesa, pela razão que explico um pouco mais abaixo.2

Assim, relativamente à grafia e pronúncia da palavra em apreço, convém observar o seguinte:

1. Entre os vocabulários ortográficos atualmente disponíveis, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da Academia Brasileira de Letras e o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da Port...

Pergunta:

Queria saber qual é a origem da vacilação entre as grafias antigas imperador/emperador.

Muito obrigado.

Resposta:

A vacilação em causa reflete uma oscilação fonética ainda hoje existente entre in/m- e en/m- em sílaba átona inicial, a qual leva alguns falantes a pronunciarem embrulhar como "imbrulhar", ou  inveja como "enveja" (cf. A pronúncia de enxada). Na norma atual prevaleceu imperador, que se aproxima mais do étimo latino, imperātore-. O Dicionário Houaiss dá conta desta evolução quando regista quer emperador quer imperador, muito embora deixando a respeito da primeira entrada a indicação de que se trata de um arcaísmo («diacronismo: antigo»).

Pergunta:

Nos últimos tempos, até por "discussão" com colegas de trabalho, tenho tido uma dúvida recorrente: quando falamos de botões/teclas, a expressão «pressione em» ou «prima em» é correta?

Ex.: «Prima em Esc.»/«Pressione em Esc.»

Para mim é totalmente incorreta, devendo usar-se «prima Esc ou «pressione Esc». Mas o que é facto é que não consigo encontrar nenhuma confirmação para a minha opinião.

Obrigada pela vossa atenção e ajuda!

Resposta:

Tanto pressionar como premir (aceita-se também a variante premer; cf. Dicionário Houaiss e dicionário da Academia das Ciências de Lisboa) são verbos transitivos: «pressione/prima (a tecla) Esc». O uso de preposição com estes verbos — o qual não é recomendável — deve-se à analogia com carregar: «Carregue em Esc/na tecla Esc.»