Pergunta:
Sei que não é a primeira vez que esta dúvida é exposta, mas, perante o que li aqui e noutros sítios, gostaria de ver esclarecido o seguinte: Se em Portugal a maioria das pessoas pronuncia "Egipto" (digo a maioria porque tenho perguntado às pessoas com quem me cruzo como pronunciam a palavra), por que razão nos pedem para escrever "Egito"? Tive oportunidade de ter uma cadeira de Introdução à Linguística, matéria que sempre me apaixonou, e não me faz qualquer sentido que seja a escrita a influenciar uma língua, quando é o contrário que tem vindo a acontecer desde que os povos começaram a comunicar. Ainda acreditei que se tratasse de uma má interpretação do Acordo Ortográfico, como acontece frequentemente com a palavra facto ou contacto, mas pelos vistos não é o caso. Não sou purista da língua e concordo com muitas das novas regras. Esta choca-me.
Obrigada pelos vossos esclarecimentos, que são sempre muito úteis, e por continuarem a defender este nosso património.
Resposta:
Embora atualmente muitos falantes pronunciem "Egipto", com o segmento [p] claramente articulado, a verdade é que se tem considerado correta a pronúncia sem esse segmento, a qual, aliás, se encontra registada por António Emiliano em Fonética do Português Europeu: Descrição e Transcrição (Guimarães Editores, 2009, pág. 92). Refira-se ainda que, muito antes do atual acordo, as Bases Analíticas do Acordo de 1945 indicavam Egipto como um caso em que a letra p era muda (Base IV):
«Conservam-se quando, sendo embora mudos, ocorrem em formas que devem harmonizar-se graficamente com formas afins em que um c ou um p se mantêm, de acordo com um dos dois números anteriores, ou em que essas consoantes estão contidas, respectivamente, num x ou numa sequência ps. Escreve-se, por isso: [...] Egipto, como egípcio; [...]»
Desta passagem, depreende-se que, há quase 70 anos, se considerava que Egipto se pronunciava "Egito", embora se escrevesse com p mudo para estar em sintonia com egípcio.
Estes dados sugerem, portanto, que a pronúncia com p ou surgiu depois dos anos 40 do século passado ou já existia como variante não sancionada pela norma. É possível que o aparecimento desta variante tenha sido suscitado pela ortografia, porque nas sociedades modernas a aprendizagem da escrita e da leitura motiva certas soluções fónicas por parte dos falantes menos familiarizados com a pronúncia culta tradicional.
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