Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Qual o significado de detergente? Existe o verbo "deterger"?

Resposta:

Existe o verbo detergir, «tirar impurezas», pouco ou nada usado, mas a verdade é que o termo detergente surge em português por imitação do francês détergent, «que limpa», formado a partir do latim detergere. É o que o Dicionário Houaiss propõe (desenvolvi as abreviaturas): «[detergente, do] latim detergens, entis, particípio presente de detergēre, "tirar enxugando, limpar, fazer desaparecer", sob influência do francês détergent (sXVII), "que limpa"; [...].» Refira-se que o verbo detergir tem origem no latim detergeo, es, si, sum, gēre, que significa «limpar, tirar, fazer desaparecer, enxugar» (ibidem).

Pergunta:

Qual a origem da expressão «Morra Marta, morra farta»?

Resposta:

Não conheço fontes que identifiquem as circunstâncias em que apareceu o dito ou provérbio «Morra Marta, morra farta» (ou a variante «Morra Marta, mas morra farta»), interpretável como «é necessário aproveitar a vida».

No entanto, há quem considere que o nome Marta na frase ocorre apenas como rima de farta, como, por exemplo, a linguista Ana Cristina Macário Lopes (Texto Proverbial Português – Elementos para uma análise semântica e pragmática, tese de doutoramento, Universidade de Coimbra, 1992, pág. 95):

«No provérbio "Morra Marta, (mas) morra farta", o nome Marta designa qualquer elemento do conjunto dos seres humanos. Neste provérbio, o tropo não afecta um item isolado, mas sim a globalidade do texto; com efeito, o provérbio em apreço é habitualmente interpretado como uma exortação epicurista do tipo "Que cada homem aproveite bem a vida!". A passagem da exortação específica literal ("Morra Marta, morra farta!") para a exortação genérica figurada ("Que cada homem aproveite bem a vida!") é desencadeada novamente pelo bloqueio interpretativo suscitado pelo (aparente) nome próprio: na impossibilidade de lhe atribuirmos um referente fixo e único, pela ausência de informação contextual, operamos uma extensão referencial compatível com o carácter normativo e sentencioso do texto proverbial. A selecção do nome Marta é ditada por imperativos contextuais, nomeadamente pela ...

Pergunta:

Qual é a tradução para «soft skills»?

Resposta:

Existem várias possibilidades de tradução, havendo entidades que não traduzem a expressão. No entanto, há quem procure criar expressões com base em palavras portuguesas; é o caso de «competências pessoais» e «competências transversais», que se afiguram boas opções.

Pergunta:

«(…) concentra a ação dramática do ator (construindo alguma dessas personagens) no exercício da pregação (…).»

Gostaria de saber se a frase que se encontra entre parênteses pode ser classificada como uma oração relativa explicativa, mesmo não tendo um pronome relativo. Caso não possa, como se pode classificar?

Obrigada.

Resposta:

Como se apresenta, é ambígua a oração reduzida de gerúndio:

a) oração adjetiva restritiva (e não explicativa), equivalente a «que constrói alguma dessas personagens», que modifica «(d)o ator» (há gramáticos normativistas que condenam o uso deste tipo de orações de gerúndio);

b) oração adverbial que denota modo, meio, instrumento, que modifica o grupo verbal da frase «concentra a ação dramática do ator...».

Se se optar pela análise em b), convém lembrar que as orações adverbiais de modo não têm feito parte das terminologias gramaticais destinadas ao ensino básico e secundário (por exemplo, o Dicionário Terminológico). Será preciso recorrer a gramáticas de referência como a de E. Bechara (Moderna Gramática Portuguesa, 2002, p. 523).

Pergunta:

Gostaria de saber da existência da designação da «pessoa que recorre aos certificados de aforro».

Obrigado.

Resposta:

Usa-se o termo aforrista ou expressões analíticas como «subscritor de certificados de aforro» ou «titular de certificados de aforro». Exemplos retirados de um documento da Caixa Geral de Depósitos:

(i) «[...] o direito dos herdeiros do aforrista de requererem a transmissão dos certificados de aforro integradores da herança daquele pode ser exercido, como decorre da lei, a partir da morte do mesmo aforrista [...].»

(ii) «[...] os direitos que o n.º 1 reconhece (à emissão de novos certificados ou ao seu levantamento) eram exercitáveis desde a morte do subscritor dos certificados de aforro [...]»*

(iii) «Tem sido este o entendimento seguido pelo IGCP, conforme informação disponível na sua página da Internet, relativa ao procedimento de habilitação de herdeiros de titular de certificados de aforro

* O artigo definido antes de «certificados de aforro» deve-se ao facto de a expressão já ter sido referida antes no texto e se encontrar, portanto, já identificada discursivamente.