Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

A língua portuguesa adoptou o termo de compadres para identificar a relação que passará a existir entre pais e padrinhos de alguém acabado de baptizar. Não se conhece, no entanto, nenhum termo que identifique a relação particular entre pais de marido e de esposa, para além do geral, sogros.

Estarei enganado?

Resposta:

É legítimo o uso de compadre como sinónimo de consogro, isto é, «pai da nora ou do genro», assim como comadre também pode ocorrer como o mesmo que consogra, «mãe da nora ou do genro». O Dicionário Priberam da Língua Portuguesa e o dicionário da Academia das Ciências de Lisboa registam compadre não só como «padrinho de uma pessoa em relação aos pais desta» mas também como «pai do genro ou da nora, em relação aos sogros deste ou desta»; esta possibilidade reflete-se em paralelo com comadre, a que as referidas fontes também associam o significado de «mãe da nora ou do genro». O plural compadres refere-se ao casal formado pelo compadre e pela comadre.

Pergunta:

Há correlação entre as palavras gajo (Portugal), gajo e gajim (ciganos), e gaijin (Japão)?

Todas parecem significar «pessoa», genericamente, ou «pessoa estrangeira» ao grupo que a emprega.

Resposta:

O termo português gajo, através da forma gajão (ou talvez gájão, não atestado), tem origem no chamado caló dos ciganos, de acordo com o Dicionário Houaiss: «cigano esp. gachó, "camponês, homem adulto"; na Espanha, gachó e gachí (fem.) referem-se a pessoas não ciganas.» Já o japonês gaijin não tem relação nem com o caló cigano nem com o português, também tendo em conta a etimologia proposta pelo Dicionário Houaiss: «[gaijin] jap. gaijin, de gai-, "externo, estrangeiro" + -jin "pessoa"».

Pergunta:

Fico em dúvida em algumas situações se usar cada ou «a cada» ou se ambos são corretos:

«Receitou xarope, uma colher (a) cada duas horas.»

«Tomar 2 g/dia (a) cada 6 horas, durante 7 a 14 dias.»

Muito obrigada!

Resposta:

A preposição a é facultativa na construção em apreço.

Observe-se que cada pode ser usado com um substantivo no plural, numa construção que a norma aceita, conforme refere Vasco Botelho de Amaral (Grande Dicionário de Dificuldades e Subtilezas do Idioma Português, 1958, s. v. cada):

«[...] Epifânio, na Sintaxe Histórica, pág. 85, escreve que se junta cada a substantivos no plural, quando o substantivo precedido de cardinal representa conjunto: "uma escada para cada doze homens" [...].»

Mais recentemente, o Dicionário Houaiss (2001) também regista esta construção:

«[Cada] usado para indicar repetição ou intervalos regulares dentro de uma série ou conjunto total (geralmente é seguido de numeral cardinal e/ou substantivo que designa ocorrência, processo ou fase de processo, período de tempo, espaço ou algo que se percorre (em sentido literal ou figurado). Ex.: "visita a tia (a) cada três semanas"; "estava tão bêbado, que caía a cada dois passos".»

Pergunta:

O que é que quer dizer azáfama?

Resposta:

O substantivo azáfama pode significar (Dicionário Houaiss):

– «grande pressa e ardor na execução de um serviço»;

– «grande atividade e confusão; atropelo, atrapalhação» (por extensão de sentido);

– «rumor alto de vozes; grita, bulha».

Refira-se que a palavra tem origem árabe, conforme José Pedro Machado regista no seu Vocabulário Português de Origem Árabe (Lisboa, Editorial Notícias, 1991): «Do árabe az-zah(a), "pressa; multidão, barafunda, balbúrdia" [...].»

Pergunta:

Podiam dizer-me se em português correto se deve escrever «em regra geral» ou em «regra geral», ou se a utilização de um ou outro depende do contexto?

Muito agradecido.

Resposta:

Pode escrever «regra geral» ou «em regra geral».

O Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa, regista como entrada de regra a expressão «(em) regra geral», na qual a parentetização de em indica que a preposição é facultativa. A mesma fonte classifica esta expressão como locução adverbial, atribuindo-lhe os significados de «segundo a prática habitual; habitualmente, geralmente». No dicionário em referência, a locução está atestada quer com preposição quer sem ela: «Em regra geral, ela faz aquele percurso em 10 minutos.» «Regra geral, a mãe não autoriza a filha a sair de casa à noite.»