Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

 Ao que me dizem, parece que algumas gramáticas modernas afirmam que gerúndio é o mesmo que particípio presente.

Será que falando é o mesmo que falante?

Obrigado.

Resposta:

O gerúndio e o particípio presente não compartilham as mesmas formas em português. A rigor, na nossa língua já não há particípio presente, ou, melhor, esta forma não faz parte do paradigma verbal. O que temos, sim, é o sufixo -nte, que permite derivar adjetivos e substantivos (amante, antecedente, ouvinte, seguinte) de temas verbais (amaranteceder, ouvir, seguir) e tem origem na desinência do particípio presente latino (-ns, -ntis). Diz Edwin Williams, em Do Latim ao Português (Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 2001, p. 191):

«Até o século XVI o particípio presente tinha força verbal mas no português moderno sobreviveu como adjetivo, ocasionalmente como substantivo, em poucos casos como preposição, e. g. salvante, tirante

Observe-se, além disso, que o gerúndio não tem, em português, uso adjetival, como se infere da seguinte observação do Dicionário Houaiss (s. v. gerúndio):

«forma nominal do verbo (q. v.), terminada em -ndo, usada para exprimir uma circunstância ou formar, quando conjugada com os auxiliares andar e estar, verbos freqüentativos, ou para expressar a ação incoativa de um verbo, quando estiver junto dos auxiliares ir e vir

No entanto, observa-se que a terminação de gerúndio -ndo é homónima de uma outra com origem no gerundivo latino1 e que pode ocorre...

Pergunta:

Que significa moche? Pelo contexto, deduzo que é um tipo de dança, género hip-hop ou assim.

Resposta:

Moche é palavra registada no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora com o significado de «ato de se atirar para cima de uma ou mais pessoas, geralmente em concertos ou festivais». O Dicionário Priberam da Língua Portuguesa também acolhe o substantivo, com o mesmo significado. Ambas as fontes o relacionam com o inglês mosh1, e o Oxford English Dictionary regista efetivamente este vocábulo com um significado muito semelhante: «Dance to rock music in a violent manner involving jumping up and down and deliberately colliding with other dancers» (tradução livre: «dançar ao som de música "rock", de uma maneira violenta, aos saltos e chocando de propósito com outros participantes na dança»).

1 Numa página da Internet, diz-se que moche «vem da palavra inglesa mosh e significa aquela espécie de "dança ao pontapé" que qualquer bom amante do rock ou do metal pratica em frente ao palco de um bom concerto de uma banda rock, punk ou metal...».

Pergunta:

Devemos utilizar maiúscula ou minúscula para designar nomes de queijos estrangeiros, como gruyère, emmenthal, etc.?

Resposta:

Escreve-se com minúscula inicial, mesmo que tenha origem em nomes próprios; ex.: «queijo gruyère/emmenthal». Como se trata de nomes estrangeiros, usa-se o itálico. Note-se, porém, que gruyère já tem aportuguesamento: gruiere (Dicionário Houaiss).

Pergunta:

Deve dizer-se «Aí gea?», ou «Aí cai geada?»?

Obrigado.

Resposta:

Se usar o verbo gear – verbo defetivo não muito frequente, só usado na 3.ª pessoa do singular (cf. chover, nevar) –, dirá geia. Bem mais comum é a perífrase «cair geada», e, portanto, é habitual dizer-se que «cai geada» ou «caiu geada».

Pergunta:

Na seguinte frase:

«O juiz comunicou a decisão ao advogado, que, por seu turno, informou o seu cliente.»

Será que esta frase não poderia ser escrita corretamente e com o mesmo sentido, sem utilizar a expressão «por seu turno»? A mim, a frase que se segue parece-me bem: «O juiz comunicou a decisão ao advogado, que informou o seu cliente.» Quando deve ser usada, e de forma obrigatória, esta expressão? Tenho dúvidas em identificar essas situações.

Muito obrigado.

Resposta:

Se suprimir a locução em causa, é verdade que a frase continua correta e mantém o seu significado essencial, o que pode levar a pensar que «por seu turno» é totalmente supérfluo. No entanto, a locução permite marcar melhor o contraste entre os dois agentes referidos na frase: por um lado, «o juiz» e, por outro, «o advogado».

Não há regras que prevejam e imponham o uso da locução «por seu turno», mas o Dicionário Houaiss apresenta alguns exemplos que permitem perceber que a locução funciona como articulador frásico e textual, contribuindo para a coesão dos discurso:

«1  por sua vez, por sua parte. Ex.: general dá ordens ao capitão, que, por seu t., as repassa aos sargentos; 2  por outro lado. Ex.: meu tio estava no supermercado e, por seu t., seu motorista andava pelo estacionamento;  3  pelo que lhe(s) diz respeito ou quando lhe(s) coube a vez. Ex.: o diretor de pessoal, por seu turno, declarou-se incompetente para fazer tal escolha.»