Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Quais são o significado e a origem da palavra capelo?

 

Resposta:

A etimologia de capelo* é a seguinte, conforme proposta do Dicionário Houaiss:

«[Do] latim medieval cappellus, i, "enfeite ou proteção para a cabeça, chapéu", derivado diminutivo do latim tardio cappa, ae, "proteção para a cabeça; certo tipo de casaco com capuz, capa; parte do vestuário que tapa a cabeça"; segundo [Antenor] Nascentes, na acepção "chapéu de cardeal", o português capelo teria sofrido influência do italiano cappello [...].»

* A palavra tem e fechado, como em medo.

Pergunta:

Existe em português de Portugal (no Brasil, já me certifiquei que existe) a palavra "coautorada"?

Antecipadamente grata.

Resposta:

Não encontro registados o verbo coautorar nem o seu particípio passado coautorado em dicionários eletrónicos elaborados em Portugal. Também não o encontro em dicionários brasileiros (ver Dicionário Houaiss, Aurélio XXI e Dicionário de Usos do Português do Brasil, organizado por Francisco S. Borba). Mas algumas páginas da Internet apontam para a possibilidade de o seu uso já se ter verificado ou estar a desenvolver-se, mesmo em Portugal, como um derivado de coautor, provavelmente por decalque do verbo inglês co-author, que é uma conversão do substantivo co-author, «coautor».

Por exemplo:

1 – «O Prof. Rui Tato Marinho realizou e co-autorou um ensaio clínico – Retreatment of HCV with ABT-450/r–Ombitasvir and Dasabuvir with Ribavirin – que foi recentemente publicado no New England Journal of Medicine» (News Faculdade de Medicina da Univeridade de Lisboa, em 2014).*

E há exemplos menos recentes:

2 – «Num desses estudos, que tive a honra de coautorar...» (Fernando Diogo, A parceria: para os beneficiários e em função do desenvolvimento local, em 2004).

Não se trata, em todo o caso, de um verbo muito usado. Além disso, mesmo admitindo a boa formação da base de derivação (é possível derivar um verbo do radical de um substantivo: almoço...

Pergunta:

Há uns dias, um aluno perguntou-me se podíamos dizer «eu vou invitar a Joana para...» em vez de «eu vou convidar a Joana...». Eu disse-lhe que não, pois invitar era uma interferência do castelhano. Entretanto, ele disse-me que tinha encontrado a palavra no dicionário. Fui verificar e, efetivamente, podemos dizer invitar. A minha pergunta é: invitar e invitação são arcaísmos?

Obrigada.

Resposta:

O facto de certas palavras estarem dicionarizadas não significa que se usem efetivamente. É o que acontece com invitar, invitação ou invitamento, que o Dicionário Houaiss regista com a observação «pouco usado»:

«invitar. Estatística: pouco usado. Transitivo direto: Requisitar a presença, o comparecimento de; convidar»;

«invitação. Estatística: pouco usado. O mesmo que invitamento»;

«invitamento. Estatística: pouco usado. Ato ou efeito de invitar, de convidar; invitação, convite.»

As formas realmente usadas em português são convidar e convite.

Em falantes que tenham o espanhol por língua materna, afigura-se óbvio que, ao aprenderem português, o uso de invitar se faça por interferência. Contudo, pode supor-se que, do ponto de vista histórico, a disponibilidade de invitar seja, afinal, um castelhanismo, hipótese que choca com a posibilidade de corresponder a um latinismo diretamente introduzido na língua, como pretende o Dicionário Houaiss, que filia o verbo no latim invito, as, avi, atum, are, «convidar (para jantar, banquete, pousar); encorajar». Isto também não significa, mesmo assim, que o contacto com espanhol não tenha contribuído para a adoção de invitar por via dos intensos contactos culturais e literários entre portugueses e espanhóis nos séculos XVI e XVII.* Nesta perspetiva, o verbo em causa seria um arcaísmo, ou seja, uma palavra sem uso na norma atual. Mas não se pense que o verbo já teve emprego significativo: quem pesquise o

Pergunta:

Parabéns pelo vosso excelente e muito útil trabalho!

Consultei dois dicionários e fiquei com algumas dúvidas acerca da melhor forma de utilizar as palavras "foção", "fução", "fossão", "fuçar", "foçar" e "fossar". Por exemplo, para designar uma pessoa que quer tudo para si e que, em linguagem popular, se pode chamar de "fução": «Ele joga bem, mas é um grande "fução", só quer a bola para si, não a passa aos outros!»

Obrigado.

Resposta:

Em nome do Ciberdúvidas, agradeço os parabéns.

Pode dizer-se que tal pessoa é um foção ou um fossão (no feminino, foçona ou fossona)*.

Tratando-se de um termo popular, é natural que se verifique certa variação regional quanto aos seus significados. É o que acontece exatamente com a palavra em questão, porque:

a) os dicionários consultados consignam foçarfossar, donde se derivam, respetivamente, foção e fossão, também registados, com significados muito próximos e provável etimologia comum;

b) o Dicionário Houaiss (2001) também acolhe o verbo fuçar, «revolver com o focinho», «remexer», «biblilhotar» e «tentar penetrar com insistência na defesa adversária», mas sem incluir o derivado fução;

c) o dicionário da Academia das Ciências de Lisboa atribui a foção a aceção de «glutão», a qual também se associa a fossão; contudo, nesta mesma fonte, só fossão é definido como o mesmo que «(aquele) que trabalha muito» e «estudioso» (na gíria, "marrão").

Esta oscilação está também registada no dicionário da Porto Editora (na Infopédia) e no Dicionário Priberam da Língua Portuguesa.

Em suma, a grafia da palavra parece ter três variantes, que oscilam entre o e u, e entre ç e ss, e é difícil apurar qual a mais adequada...

Pergunta:

Dizer «expoente máximo» é redundante? É expoente um termo absoluto?

Obrigado.

Resposta:

Não acho que «máximo expoente» seja uma redundância ou verdadeiro pleonasmo, mas muito depende, efetivamente, do significado que se atribuir a expoente.

Há quem considere que expoente é o indivíduo que mais se destaca entre os membros de um grupo, e, portanto, a palavra já tem valor superlativo, pelo que a expressão «máximo expoente» é um pleonasmo a evitar (cf. definição do Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, na Infopédia). No entanto, há dicionários (por exemplo, o Houaiss) que definem expoente sem lhe atribuírem tal valor superlativo, querendo dizer «pessoa ilustre, de mérito», o que permite que, em referência a um conjunto, se possa afirmar que há vários expoentes, sendo um deles o «máximo expoente». Nesta perspetiva, não se pode dizer que «máximo expoente» seja expressão incorreta.