Ana Martins - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Ana Martins
Ana Martins
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Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas – Estudos Portugueses, pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, e licenciada em Línguas Modernas – Estudos Anglo-Americanos, pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Mestra e doutora em Linguística Portuguesa, desenvolveu projeto de pós-doutoramento em aquisição de L2 dedicado ao estudo de processos de retextualização para fins de produção de materiais de ensino em PL2 – tais como  A Textualização da Viagem: Relato vs. Enunciação, Uma Abordagem Enunciativa (2010), Gramática Aplicada - Língua Portuguesa – 3.º Ciclo do Ensino Básico (2011) e de versões adaptadas de clássicos da literatura portuguesa para aprendentes de Português-Língua Estrangeira.Também é autora de adaptações de obras literárias portuguesas para estrangeiros: Amor de Perdição, PeregrinaçãoA Cidade e as Serras. É ainda autora da coleção Contos com Nível, um conjunto de volumes de contos originais, cada um destinado a um nível de proficiência. Consultora do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa e responsável da Ciberescola da Língua Portuguesa

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Gostaria de saber se, na frase «deixamos a tradicional estrutura baseada em dois serviços», o adjetivo tradicional seria considerado um modificador, ou um predicativo do objeto direto.

Obrigada.

Resposta:

Na frase, tradicional é um modificador do nome.

1. Pode ser suprimido:

«Deixamos a estrutura»
«*O presidente achou 1 a estrutura»

2. Integra, com o nome estrutura, um único constituinte, podendo ser, por isso, pronominalizável:

«Deixamos a tradicional estrutura»
«Deixamo-la»

De notar que num predicado verbo-nominal estão em causa dois constituintes:

«O presidente considerou a estrutura tradicional»
                                       OD          Predicativo OD

3. O modificador pode ser anteposto ou posposto ao nome; o predicativo do complemento dire{#c|}to é sempre posposto:

«Deixamos a tradicional estrutura»
«Deixamos a estrutura tradicional»
«O presidente achou a estrutura tradicional»
«*O presidente achou a tradicional estrutura»

1 Achar enquanto sin{#ó|ô}nimo de julgar.

Pergunta:

Li uma frase e fiquei com dúvida sobre o verbo. A frase é: «Cabe a vós investigar.»

1. A frase está correcta?

2. Existe uma regra para o verbo concordar ou não com o sujeito?

3. A construção «cabe a eles investigarem o caso», com o verbo a concordar com o sujeito, parece-me mais correcta.

Resposta:

1. Diz-se cabe-vos/cabe-lhes; a vós/a eles podem figurar como redobro:

 

«Cabe-vos a vós»; «Cabe-lhes a eles»
«Já o batismo das suas cadeiras com os nomes preclaros e saudosos da ficção, da lírica, da crítica e da eloquência nacionais é indício de que a tradição é o seu primeiro voto. Cabe-vos fazer com que ele perdure.» Machado de Assis, Textos Críticos

 

2. Sim, o sujeito e o verbo partilham os mesmos valores de pessoa e número.

3. A vós/vos e a eles/lhes não têm a função de sujeito, mas de complemento indirecto. Vale a pena rever:

Pronomes pessoais:

1— com função de complemento indirecto sem preposição: 

me, te, lhe, nos, vos, lhes;
 
2— com função de complemento indirecto com preposição:
(a) mim, (a) ti, (a) si, ele, ela; (a) nós, (a) vós; (a) si, eles, elas

 

Pergunta:

Tenho uma questão relacionada com literatura, mais propriamente com a classificação do narrador. Será errado referir-se ao narrador como presente e ausente, ou será mais correcto dizer-se participante ou não participante, uma vez que um narrador está obrigatoriamente presente na história, pois é sempre ele que a relata?

Resposta:

1. Os termos presente vs. ausente e participante vs. não participante recebem definição equivalente nos manuais escolares. Os estudos narratológicos estruturalistas (na esteira de Genette, 1972) usam os termos heterodiegético vs. auto/homodiegético (ver «Textos relacionados»).

2. A presença ou ausência do narrador não diz respeito a nenhuma materialização ontológica, mas ao facto de o discurso apresentar, ou não, marcas de primeira pessoa, que não estejam estritamente integradas em discurso relatado (directo, indirecto ou indirecto livre), designadamente, formas pronominais e verbos (perceptivos, volitivos, epistémicos, etc.) na primeira pessoa (do singular ou do plural). Pense-se no narrador ausente como um "narrador nulo": é como se a história se contasse a si própria.

3. Os termos participante vs. não participante visam a acumulação de papéis narrador-personagem, o que, para efeitos de atestação das marcas linguísticas de subjectividade usadas no discurso, vai dar no mesmo.

4. Não confundir narrador com autor: o autor é uma entidade real e empírica; o narrador é sempre o produto da "alquimia ficcional". (ver Reis, Carlos; Macário Lopes, A. C. – Dicionário de Na...

Pergunta:

Eu quero a ajuda de vocês para esclarecer uma dúvida.

Tenho um trabalho de Português para fazer e lá pedem uma frase com o advérbio de negação não. Mas que nessa frase ele não tenha ideia de negação. Por favor, me digam uma frase onde isso acontece.

Obrigada.

Resposta:

Veja-se o caso das perguntas retóricas:
«Não queres ir ao cinema? [= queres ir ao cinema]. Então estuda primeiro.»

Pergunta:

Gostarei de saber como fica, pelo acordo ortográfico vigente a partir de 1/1/2009, a grafia das palavras "sócio-educativa", "não-diretiva" e "anti-liberdade".

Agradeço a atenção que dispensarem à minha solicitação.

Resposta:

1. Nenhuma das palavras inquiridas está atestada nos dicionários consultados.

2. Se admitirmos que estas palavras fazem parte do léxico do português, então elas escrevem-se assim:
socioeducativo (como socioecon{#ó|ô}mico); não-diretiva (como não-beligerante, não-conformista); antiliberdade (a forma não é abrangida por nenhuma excepção à supressão do hífen em palavras derivadas com prefixo anti-).

3. Para saber a grafia específica de uma palavra, como é o caso desta pergunta, pode consultar: