Ana Carina Prokopyshyn - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Ana Carina Prokopyshyn
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Ana Carina Prokopyshyn (Portugal, 1981), licenciada em Línguas e Literaturas Modernas (2006) e mestre em Linguística Geral pela FLUL (2010). Desde 2010 frequenta o doutoramento em História Contemporânea (Lusófona e Eslava). Participou com comunicações e a nível da organização em várias conferências internacionais, e presta serviços em várias instituições como professora de Português para estrangeiros, tradutora e revisora. Atualmente é leitora de Língua e Cultura Russa I e II na mesma universidade e investigadora no Centro de Línguas e Culturas Lusófonas e Europeias. Colabora como consultora de língua Portuguesa no Ciberdúvidas desde 2008.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Hoje no jornal ouvi a expressão «crescimento negativo». Achei um bocado estranho e gostaria de saber se é correcto usá-la.

Resposta:

É um pouco arriscado avaliar qualquer expressão fora do seu contexto. Crescimento é o acto/processo de crescer, biologicamente, mas também se aplica como termo matemático, significando multiplicação, ampliação, expansão, ou aumento em dimensão, volume ou quantidade (Ex.: «crescimento populacional», «crescimento de reservas», «crescimento da criminalidade»). Nestes casos, a expressão «crescimento negativo» não faz sentido, deve-se usar, como antónimo de crescimento: decréscimo. Quando crescimento tem um sentido figurado, aplicado a valores materiais e/ou morais, para designar «desenvolvimento», termo muito usado na economia ou na política, pode ser seguido de adjectivos qualitativos: (Ex.:«A economia portuguesa poderá ter registado um crescimento negativo [surpreendente/positivo] no segundo trimestre de 2005, devendo voltar a apresentar taxas positivas na segunda metade do ano. No conjunto de 2005, o crescimento do PIB português deverá situar-se, em média, abaixo de 1%...» Fonte: Diário de Notícias, 7 de Junho de 2005).

Pergunta:

Aparentemente, há uma nova moda acabadinha de chegar a Portugal. A actividade, popular nos EUA e no Brasil, do "rodeo". A minha dúvida é se será correcto aportuguesar o termo para "rodeio" (penso causar demasiado ruído, obrigando a parar de ler para perceber o sentido) ou manter o original "rodeo", uma vez que se encontra generalizado.

 

Resposta:

Não se trata de aportuguesar o termo. A palavra que existe em português, quer do Brasil, quer europeu, é, precisamente, rodeio.

Leia-se a definição da entrada rodeio no Dicionário Electrônico Houaiss (versão brasileira): «substantivo masculino: 1 acção ou efeito de rodear; rodeamento; 2 volta, giro em redor de algo; 3 curva que se descreve, afastando-se do caminho, alongando-o; […] Regionalismo – Brasil: lugar, em campo aberto, onde se realiza essa reunião; rodeador; 9 prática em voga nos meios rurais de alguns países que consiste em montar cavalo ou boi não domesticado e manter-se sobre o animal o máximo de tempo; 10 competição entre aqueles que realizam essa prática; 11 local onde se realiza essa competição.»

Como pode ver, a popular competição chama-se, mesmo no Brasil, rodeio, e não “rodeo", cuja entrada nem sequer existe no dicionário. O termo “rodeo” vem, sem dúvida, do inglês americano, mas surgiu nesta língua como empréstimo do castelhano rodeo, «rodeo», que facilmente se pode aportuguesar como rodeio. Hoje, cada vez mais, as palavras estrangeiras entram na língua inalteradas, contudo, não faz sentido utilizarmos um termo americano quando já existe um termo português: rodeio.

Pergunta:

Gostaria que me ajudasse a responder às seguintes questões: Aplicando o teste de interrogativa, indique os constituintes com as relações gramaticais de oblíquos e adjuntos:

– A polícia interpelou rapidamente os insurgentes no centro da vila de Mocimboa da Praia.

– A polícia tirou os manifestantes do gabinete eleitoral.

– A polícia transportou os manifestantes para a cadeia.

Gostaria também que me ajudassem a indicar nas mesmas três frases as funções semânticas dos constituintes com as relações gramaticais de adjuntos.

Obrigada.

Resposta:

Os constituintes com relações gramaticais oblíquas são, por exemplo, «do gabinete eleitoral» e «para a cadeia» em:

– «A polícia tirou os manifestantes do gabinete eleitoral

– «A polícia transportou os manifestantes para a cadeia

O constituinte com a relação gramatical de adjunto é, por exemplo, «no centro da vila de Mocimboa da Praia», cuja função semântica é a de locativo (lugar onde), na frase:

– «A polícia interpelou rapidamente os insurgentes no centro da vila de Mocimboa da Praia

Ambos os constituintes são precedidos por uma preposição, a diferença entre oblíquos e adjuntos é que os primeiros são obrigatórios, e sem eles a frase é agramatical, desprovida de sentido, enquanto os segundos, como o próprio nome indica, são "opcionais" ou "adjuntos". Estes últimos podem manter uma grande variedade de relações semânticas (instrumento; comitativo; beneficiário; tempo; duração ou frequência; locativo ou direccional).

Exemplos:
(a) «O João cortou-se (com uma faca).» (Instrumental)
(b) «O João foi jantar (com o Manuel).» (Comitativo)
(c) «O João comprou um anel (para a Maria).» (Beneficiário)
(d) «O João janta (às 19h).» (Tempo) (todos os dias). (Frequência)
(e) «O João janta (na cantina)». (Locativo)
(f) «O João escreveu uma carta (para o Brasil).» (Direccional)

Pergunta:

Gostava de saber qual a palavra correcta: "quinésica", ou "cinésica"?

Procurei nos dicionários, e não encontrei "quinésica", embora tenha encontrado "quinesoterapia". Porém, no Houaiss (edição electrónica brasileira) já se encontra o termo cinésica. Estou confuso e gostaria que me esclarecesse acerca destes termos.

Obrigado pela vossa resposta.

Resposta:

O termo correcto, ligado à semiologia, é cinésica, cuja entrada no Houaiss o descreve da seguinte forma: «parte da semiótica que estuda os movimentos e processos corporais que formam um código de comunicação extralingüística, entre os quais o enrubescimento facial, o menear de ombros, os movimentos de olhos etc.». Por sua vez, esse termo tem como raiz kinésis, termo grego para «movimento», que entra no português como cine- ou quine-,  na composição de várias palavras, daí a dúvida. Novamente, no Houaiss encontramos entrada para quines-, cine- e - cinesia, e verificamos quando usar cine- ou quine-: 

quines -: «elemento de composição, antepositivo, do gr. kínésis, eós 'movimento; agitação política' — ver cine- e - cinesia, f. canônicas da língua; ocorre em palavras como quinesiergógrafo, quinesiergograma, quinesimetria, quinesímetro, e como pospositivo em braditeleoquinese, psicoquinese; a grafia de - qui- provém de aportuguesamentos através (por vezes) do ing. ou sobretudo do al., línguas ocidentais de cultura em que o rad. gr. em causa é, não raro, transliterado com k

cine-: «elemento de composição, antepositivo, do gr. kínésis, eós 'movimento; agitação política', e seus der. kínéma,atos 'movimento; dança, pantomima; movimento político' (raro), kinétós,ê,ón 'movível', kinétikós,ê,ón 'motor, promotor, cinético'; ocorre a partir do sXIX, sobretudo em compostos da termi...

Pergunta:

O professor poderia, por gentileza, me esclarecer a questão abaixo?

Gostaria que o professor apontasse a alternativa correta e que me explicasse como analisar a função sintática.

«1 — Assinale a alternativa em que o termo em destaque tem a mesma função sintática que a expressão destacada na frase:

— Vou lançar UM POLICIAL!

1 — Penso O CONTRÁRIO.

2 — ... contou-ME.

3 — Sempre fui FÃ DE ROMANCES POLICIAIS.

4 — ... surgiu UMA SAFRA DE ROMANCES POLICIAIS.

5 — UM BOM LIVRO também ajuda a relaxar.»

Resposta:

Tentaremos indicar-lhe a forma mais simples de identificar funções sintácticas numa oração.

Antes de mais, memorize uma regra fundamental: verbos copulativos, como ser e estar, pedem nome predicativo do sujeito (Ex.: «Eu sempre fui bonita/professora/fã de romances policiais.»), logo, a expressão destacada da frase (3) é o nome predicativo do sujeito do verbo ser.

A alternativa cujo destaque tem a mesma função sintáctica que «um policial» é a alternativa (1): «o contrário». São ambos o complemen|objecto directo da oração a que pertencem. Um dos testes para a identificação desta categoria sintáctica é a formulação de uma frase passiva correspondente, em que o complemen|objecto directo passa a sujeito. Vejamos:

(i) «Um policial vai ser lançado por mim.»

(ii) O contrário é pensado por mim.»

Outro teste é a substituição do complemen|objecto directo por um pronome clítico na forma acusativa:

(iii) «Vou lançá-lo.» (Um policial)

(iv) «Penso-o.» (O contrário)

Para identificar o sujeito de uma oração, existe, por exemplo, um teste muito simples; formula-se uma interrogativa de instanciação («Quem/o que é que faz x?»), cuja resposta é o sujeito. Ora, identifiquemos o sujeito de cada uma das frases:

(v) «Quem é que vai lançar um policial?»
Eu.
(Eu) vou lançar um policial.

(vi) «Quem é que pensa o contrário?»
Eu.
(Eu) penso o contrario.

(vii)...