Que avaliação se pode fazer à consagração de um dia – no caso, o dia 5 de maio, assim instituída pela CPLP – para a celebração da língua portuguesa? Neste trabalho publicado no "Jornal de Notícias", dá-se conta do que falta (ainda), e muito: uma política concertada da língua, em Portugal como nos demais países lusófonos.
Há seis anos que 5 de maio é sinónimo de Dia da Língua Portuguesa. Instituída pela Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), a celebração pretende reforçar o papel do Português e da cultura lusófona no Mundo.
O dia de hoje [5 de maio de 2015] não será exceção, com os temas da ciência e da inovação a servirem de base às comemorações, depois de no ano passado ter estado em evidência o potencial económico da língua.
Arlinda Cabral, responsável pelo serviço de tecnologia da CPLP, destaca o papel que o Dia da Língua tem desempenhado, «ao contribuir para atenuar diferenças e aproximar pessoas», embora reconheça que a iniciativa padece de falta de visibilidade. «Ainda há muito por fazer», diz. Guiné Equatorial ainda em falta. A instituição de uma data que enaltece a língua é do agrado das associações encarregadas da defesa do Português. Mas, embora não discutam os méritos da ação, os responsáveis auscultados pelo JN salientam que a prioridade deveria ser outra.
Cofundador e responsável editorial do portal Ciberdúvidas, José Mário Costa adianta mesmo que a ideia «será destituída de valor se não houver políticas de concertação» entre os estados membros da CPLP.
Da ausência de uma simples coluna dedicada à língua portuguesa nas páginas dos principais jornais nacionais, passando pelo encerramento de leitorados de português em universidade nevrálgicas, até à inexistência de um simples prontuário gramatical nos PALOP, são vários os exemplos, segundo o mesmo interlocutor, de um grave desleixo em redor da língua. Mas o exemplo que considera mais chocante é o da Guiné Equatorial, admitida a CPLP em 2014. «Os seus dirigentes comprometeram-se a adotar o Português como língua oficial mas, passado este tempo, o portal do país continua apenas a estar [em Espanhol] e Francês, os outros idiomas oficiais.»
Os receios de José Mário Costa de que a efeméride «se esgote nos discursos de ocasião» são partilhados por Francisco Nuno Ramos, membro do conselho diretivo do Observatório da Língua Portuguesa.
O dirigente considera incompreensível que o quarto idioma mais falado no Planeta, com 261 milhões de utilizadores, continue «sem dispor de uma política da língua». Uma das medidas que poderia, em seu entender, contribuir para a expansão seria a obrigatoriedade de cada membro da CPLP assumir o ensino do idioma nos respetivos países limítrofes. «A prioridade tem que estar nos centros educativos da língua portuguesa», defende.
in "Jornal de Notícias" de 5 de maio de 2015