Adaptação dos computadores ao português discutida em Lisboa
A adaptação dos computadores à língua portuguesa é considerada pelo Ministério da Ciência e da Tecnologia uma área prioritária. O que terá implicações, por exemplo, nos correctores ortográficos e nos programas de tradução automática. Sem essa adaptação, há quem diga que é difícil a sobrevivência de uma língua natural na sociedade de informação.
Um primeiro esboço sobre a investigação científica feita em Portugal para adaptar o mundo dos computadores à língua portuguesa foi apresentado ontem no Fórum Picoas, em Lisboa. Quer a adaptação para português da terminologia criada pelos novos suportes tecnológicos, quer a capacidade de utilização da língua portuguesa pelos computadores (ou processamento computacional) é o objectivo desta área da ciência, que ganha importância à medida que a informática e as novas tecnologias de informação ocupam espaço na sociedade. Mas o balanço não é positivo, por agora. "Não basta adaptar de forma grosseira algo concebido por técnicos e investigadores estrangeiros para um público também estrangeiro. É preciso conceber ferramentas para um público português." É deste modo que Diana Santos, doutorada em Engenharia Informática e de Computadores, justifica a necessidade do processamento computacional na nossa língua natural. Luís Magalhães, presidente da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), a quem coube a abertura da sessão de ontem, afirmou mesmo que "as coisas tendem a acabar, se não houver a noção de que tem de haver uma adaptação, o que pode acontecer com a língua portuguesa".
Diana Santos foi encarregada, no ano passado, pelo Ministério da Ciência e da Tecnologia, de dirigir o projecto "Processamento Computacional do Português". Com base neste trabalho, a investigadora apresentou ontem o ponto da situação desta área. Ainda não é um perfil, como fez questão de sublinhar, uma vez que o processamento computacional do português não passou por uma avaliação como já aconteceu a outras áreas. Desse processo de avaliação já resultou a publicação, pelo Observatório das Ciências e das Tecnologias, de uma colecção de livros sobre investigação científica em variados campos e que tem sido apresentada desde Fevereiro. No caso do processamento computacional da língua portuguesa, Diana Santos prefere chamar ao seu trabalho "contributos para um perfil da área".
Depois de serem traçados todos os retratos das áreas científicas, o Observatório das Ciências e das Tecnologias, em conjunto com a FCT, vai elaborar o Livro Branco do Desenvolvimento Científico e Tecnológico Português. Este último documento fará um levantamento da situação e das necessidades da ciência nacional, para que seja contemplada com fundos do Quadro de Apoio Comunitário.
Segundo Diana Santos, a situação do processamento computacional do português é má, no geral, os investigadores não são muitos e a área tem sido pouco estudada: "É uma área que não é reconhecida, os investigadores guardam para si o resultado do seu trabalho, não há publicação da investigação e o consenso é, na maioria dos casos, difícil de encontrar." Para que a área evolua, a investigadora diz que deve haver "maior transparência, nomeadamente no que toca a concursos públicos". É também necessário, prossegue Diana Santos, que o Estado, os investigadores e a indústria unam esforços nesse sentido.
Henrique Carreiro, representante da Microsoft na reunião, assegura que o tratamento dos conteúdos informáticos na língua natural é uma prioridade para a empresa. No laboratório de investigação da Microsoft, essa preocupação é tida em conta nos correctores ortográficos, nos programas de tradução automática e na própria pesquisa de terminologia: "Um dos objectivos é criar programas interactivos, que permitam ao utilizador falar com o computador como se falasse com outra pessoa na sua língua natural. Mesmo porque a maioria das pessoas em Portugal não tem os conhecimentos necessários da língua inglesa." Contudo, afirma que vai ser difícil eliminar alguns estrangeirismos que já foram adoptados pelo português: "Ninguém usa a expressão 'suporte lógico' em vez de 'software' ou 'equipamento' em vez de 'hardware'." Diana Santos, pelo seu lado, considera essencial que os portugueses disponham de sistemas informáticos na sua própria língua: "Os computadores é que se devem adaptar às pessoas e não as pessoas aos computadores."