A PT lançou agora um anúncio com o slogan escrito assim: «XAMADAS A ZERO XÊNTIMOS PARA TODAS AS REDES FIXAS.»
Uma das estratégias actuais do discurso publicitário é alterar a forma convencional de escrever as palavras para, criando uma analogia inusitada entre grafia, fonia e sentido, causar surpresa e provocar o riso.
Uma vez definida bem a fronteira entre jogo e erro ortográfico, as charadas gráficas da publicidade em nada ferem o respeito pelas regras do código da escrita.
Ouvi contar que um maduro cá da terra pôs na montra da sua loja o letreiro: «PREÇOS EMBATÍVEIS». Foi avisado: não era "embatíveis", era imbatíveis, ao que respondeu: «Embatíveis — sim. São preços de embate!» Aí está: teríamos aqui um bom anúncio, não fora a incerteza sobre se o jogo do e e do i era voluntário ou involuntário.
Chamadas (chamar) escreve-se com ch, porque o grupo de consoantes no latim cl evoluiu para ch: CLAMARE > chamar. Aliás, clamar existe em português, mas usado noutro registo e sentido.
Cêntimos escreve-se com c porque tem o étimo na forma latina CENTUM — presente em centigrama e em centímetro, mas também em centopeia...
A troco de que lógica ou associação espirituosa se ignorou a fisionomia destas palavras? Será que ao escrever "xêntimos" se quis imitar a pronúncia irregular da personagem da versão televisiva do anúncio? Mas, se é isso, porquê "xamadas", que não implica alteração de pronúncia?
A graça passa ao lado e fica só a apologia de que a grafia pode ser mudada sempre que não há mais ideia nenhuma para criar um anúncio.
artigo publicado no semanário Sol (coluna Ver como se diz) de 5 de Maio de 2007