Apicanta, terceira pessoa do presente do indicativo do verbo apicantar: esta surpreendi-a recentemente num anúncio de página inteira da edição de 23 de Setembro do Metro que reclama para si o título de maior jornal diário gratuito do mundo, comprovado pelo Guinness World Records. O anúncio rezava assim: «Tudo o que sempre quis saber sobre o sexo… mas tem vergonha de perguntar. Com entrevistas exclusivas feitas pela equipa editorial Global Metro, o Metro apicanta o próximo dia 27 de Setembro.»
O verbo soa, porventura, um pouco estranho. Talvez por não se reconhecer de imediato no verbo o seu substantivo de origem (picante), dada a mudança de terminação – embora existam variados substantivos e adjectivos acabados em -e que são base de derivação, como por exemplo brilhante, que gerou abrilhantar. Talvez porque, cumulativamente, possa suscitar dúvidas, num primeiro olhar, a sua própria prefixação (a- ou api-). Fosse reconhecível, ainda que por efeito involuntário da terminação -ar, integralmente no verbo o seu substantivo de origem, como acontece com apimentar, resultante de pimenta, arriscaria a afirmar que este verbo estaria aí para ficar. Assim, talvez fique, talvez não fique, dependendo do modo como for sendo recebido e utilizado. Mas pouco há a dizer relativamente à sua construção. Veja-se até, na comparação com apimentar, retirando o prefixo a- e a terminação -ar, como ambos têm radicais simétricos: piment- e picant-.
Reconheça-se, ainda, a pertinência da utilização do verbo – que, obviamente, não está dicionarizado – naquele contexto. Quem o cunhou, fê-lo de forma consciente e deliberada, porque considerou insuficientes os verbos alternativos que a língua lhe fornecia. Para criar aquele efeito – e em matéria de sexo, compreende-se que não chegava o apimentar – era necessário algo de mais superlativo… exactamente como o é o picante em relação à pimenta…
* Com a colaboração de Carlos Rocha.