A confusão no emprego da expressão «estar/andar/pôr ao corrente de» com o substantivo (e adjetivo) «ocorrente» é o tema central desta crónica do autor sobre os usos do português em Angola, publicada no semanário luandense Nova Gazeta, do dia 20 de agosto de 2015.
Na oralidade, às vezes, se os nossos ouvidos estiverem com cera exagerada, parece que o que ouvimos é mesmo isso: «Põe-me ocorrente da situação». Quando dizem algo que se parece com a frase em destaque, as pessoas pretendem dizer «mantenha-me informado/a», «quero estar dentro do assunto».
Parece que a ânsia de se manter informada leva a que muita gente cometa atropelos, às vezes, involuntários. Por isso é que os normativos linguísticos aconselham a consulta permanente e actualizada. É, na verdade, uma forma de as pessoas «serem postas ao corrente», correctamente, dos mais variados assuntos.
Compreende-se que o vocábulo ‘ocorrente’ tenha alguma proximidade no que diz respeito à pronúncia à expressão ‘ao corrente’, mas, para que não haja mais dúvidas, são ‘coisas’ completamente diferentes. O esforço deve ir no sentido de pronunciarmos correctamente o ditongo decrescente ‘ao’, resultante da combinação da preposição ‘a’ e o determinante articular masculino singular ‘o’.
Não é, portanto, pelo facto de ela não ser bem vista por muitos gramáticos que a vamos marginalizar. Quem sentir que se trata de uma expressão ‘pesada’ pode servir-se de outras opções, como por exemplo, «estar ciente», «estar informado». O que não pode acontecer é vivermos na indefinição.
Para já, ‘ocorrente’ significa «relativo ao que ocorre ou acontece». Tem relação com o verbo ocorrer. ‘Corrente’, por sua vez, tem sentido de algo/alguém que corre, é relativo ao verbo correr. Corrente está ligado ao que se desenrola no momento presente, ao que decorre de uma forma habitual e normal.
As expressões «andar/estar ao corrente» e «pôr ao corrente» querem dizer, respectivamente, «andar/estar informado» e «informar». Por isso, preciso que me ponham sempre ao corrente das situações.
Crónica da autoria de Edno Pimentel e publicada na coluna "Professor Ferrão" do jornal luandense "Nova Gazeta", em 20/08/2015. Manteve-se a ortografia conforme a norma ainda aplicada em Angola, a qual é anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.