Extrato do romance Homem de leis perdido nos trópicos procura senhora honesta, onde o autor discorre sobre essa «praga nacional multiusos», que serve tanto para enternecer como para amesquinhar. Manteve-se a grafia original, anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.
(...) De casaco já despido, abriu também a geladeira para tirar um suco de caju. Silvinha inspeccionava com ar de felino que observa coelho. Muitos segundos e um iogurte depois, concluiu: «Dri, vou passar a te chamar Dri. Na verdade: Drizinho.»
Foi assim que uma página nova se abriu no livro daquela vida portuguesa.
De menino a velho sempre fora Rodrigo. A mãe não autorizava diminutivos. Outros seriam Zé, Paulinho, Carlitos. Ele era Rodrigo de Menezes. De. Menezes.
A lei de bronze nunca fora violada. Nos calores do climax sempre ouvia gritar «Rodriiigo» ou Rooooddrigo» ou «Rodrigoooo!» No mundo dos adultos, ficou, de forma honrada, sem equivalências nem cursos de fancaria, «Dr.» antes do R, passando a «Doutor Rodrigo».
Através de um simples gesto, nua como Eva no Paraíso, Silvinha zipara três sílabas numa só. Insatisfeita com a obra, acrescentara intuitivamente — e da forma correcta — um «zinho».
Na tumba, a mãe deve ter dado um uivo, porque era, de todas, a coisa que mais receava e detestava. Desde cedo, amestrara o filho para evitar «inhos» «itas», fugindo ao tique lusitano que a tudo acrescenta essa prótese nefanda.
Eminentemente multiusos, a praga nacional serve para enternecer (queridinha) mas também para amesquinhar («tira já de mim essa pilita»). As palavras terminadas em ditongo exigem a forma -zinho ou -zito (mãezinha, cãozinho, pãozinho). As palavras terminadas em vogal precedida de vogal também exigem esta forma (cotoviazinha, riozinho). Nas terminadas em -e, -i ou -u, emprega-se predominantemente a forma -zinho ou -zito (baldezinho, cafezinho, cuzito). Nas palavras terminadas em -r ou -m, também se emprega predominantemente esta forma: lugarzinho (lugar + zinho), homenzinho. Para complicar, é preciso saber contextualizar para conseguir atinar com o significado escolhido pelo emissor: putinha, por exemplo, pode ser ternura ou agressão; zita acontece ser, também, nome próprio; «ó seu caralho» pode ser uma forma fraterna perfeitamente apropriada para saudar um amigo na região do Porto e arredores. Uma tortura para americanos, bifes mal passados, franciús e outros gringos vários.
No caso em apreciação, DRI era curto. Drizinho parecia caricato. Alvitrou, como se tratasse disso constantemente, do bar à cama: «Drinho, por favor! Os amigos chamam-me Drinho! Drinho de Menezes!»
Havia nisto um plágio descarado da métrica melódica da famosa frase de autoapresentação do 007, o célebre «My name is Bond, James Bond», mas não lhe pareceu que isso pudesse ser detectado pela interlocutora. (...)