Sinónimo de «complicação», «emaranhamento», «confusão», «tumulto», o termo – sarcasticamente abordado nesta crónica do autor, publicada no jornal “i” de 20/11/2014 – remonta a um episódio da mitologia grega. Antes, muito antes, da operação policial que, precisamente com o mesmo nome, levou à detenção de uma dúzia de pessoas influentes e a uma demissão ministerial, em Portugal.
«Achareis rafeiro velho/que se quer vender por galgo;/diz que o dinheiro é fidalgo/que o sangue todo é vermelho.»
Os versos de Camões poderiam ter sido escritos a pensar na "operação labirinto".
Labirinto é um conjunto de percursos intrincados, criado para desorientar quem o percorre. Antes do labirinto dos vistos dourados houve um outro, em Creta, construído por Dédalo para alojar o Minotauro, homem e touro que devorava jovens. Teseu derrotou o monstro e encontrou o caminho de regresso com a ajuda do fio de Ariadne.
Assim como o labirinto de Creta é anterior a Teseu, o labirinto nacional não pode ter sido criado no dia em que [o vice-primeiro-ministro português Paulo] Portas se lembrou de adoptar os vistos dourados em Portugal. As cumplicidades labirínticas são afectuosas, antigas e respeitáveis. [O demissionário ministro da Administração Interna português Miguel] Macedo percebeu-o: labirinto implica intencionalidade na construção e consciência do perigo para quem nele penetra. Tem uma única saída, que é também a entrada. É sinónimo de complicação, emaranhamento, confusão e tumulto.
Os labirínticos vistos dourados têm poucos argumentos a seu favor: criaram magros empregos, deram vistos de residência e acesso ilimitado à Europa a chineses e russos (que compraram imóveis acima do preço de mercado e abriram contas bancárias europeias), detiveram uma dúzia de pessoas influentes, despediram um ministro, nomearam uma ministra, desacreditaram instituições essenciais à segurança da nação. Causam horror e espanto. Apesar da irrevogável vigilância que [Paulo] Portas jurou exercer sobre o assunto.
texto publicado com o mesmo título na coluna do autor O Ponto do i, no jornal i, de 20 de novembro de 2014. Manteve-se a grafia anterior ao Acordo Ortográfico seguida pelo jornal.