As férias já fazem parte do passado. Estou pela primeira vez (depois das férias) em frente do ecrã a tentar de escrever um texto sobre as férias. Não é fácil. A língua portuguesa em Portugal ficou ainda mais estranha para mim. Tenho de aproximar-me dela mais uma vez, e de uma maneira diferente. Isto por várias razões.
Uma, talvez a primeira, é que, ao estar no país, uma pessoa precisa de se exprimir espontaneamente, em frases curtas, precisas, sobre objetos vulgares da vida de dia-a-dia. «Onde é a casa de banho?, «Há palitos na sua loja?», «Onde é que encontro os atacadores?». É preciso perguntar rapidamente e estar atento à resposta que, dependendo do lugar onde estamos, da procedência do interlocutor, da sua idade e da sua formação, tem o seu idioleto. Um obstáculo tremendo é o facto de os portugueses não estarem habituados a que um turista fale a sua língua. E, na verdade, mesmo se souber português, não o fala propriamente. A sua pronúncia é estranha, a maneira de expressar-se também. Em resultado disso, a empregada na loja, no restaurante, no hotel, não percebe que o turista lhe está a falar em português e então também não percebe a sua mensagem e começa a falar em inglês. O turista sabe inglês, mas não tem vontade de falar em Portugal, com os portugueses, numa terceira língua. Atrapalha-se e não se lembra das palavras mais comuns. Tudo o que aprendeu em casa se quebra em cacos.
O que também contribui para a atrapalhação é a situação de, ao estar no país, o turista está repentinamente tão metido na língua estrangeira que lhe falta a distância que, ao estar em casa, em frente do computador ou lendo um livro, lhe permite procurar tranquilamente a palavra ou a forma gramatical adequada. A situação nova muda radicalmente a ótica. Na situação artificial, de aprendizagem, olha para a língua estrangeira num ângulo obtuso, ou seja, é capaz de abranger as suas possibilidades linguísticas quase na sua totalidade; mas na situação “real”, por exemplo, na loja em Portugal, o seu ângulo de visão é agudo: ele acede apenas a uma pequena parte dos seus conhecimentos da língua estrangeira.
Para mim, um dos problemas maiores foi o inglês. Para algumas pessoas que trabalham no turismo há dois tipos de pessoas: os portugueses, que falam português, e os turistas, que falam inglês, todos, sem exceção. O turista que fala português comete uma transgressão dos limites estabelecidos. Assim pode acontecer que um empregado português fale obstinadamente inglês com um turista sem se interessar por aquilo que o turista lhe diz em português. Para ele, é mais importante manter os papéis prescritos – eu Tarzan, tu Jane - do que comunicar com o cliente. Fiz esta experiência mais uma vez ao comprar as passagens da Madeira para Porto Santo. O empregado compreendeu perfeitamente o que eu lhe disse em português, mas respondeu-me num inglês que nem eu nem a minha mulher fomos capazes de entender. Mas é preciso ser justo: a maioria dos empregados turísticos da Madeira e do Porto Santo têm um nível de inglês e de francês muito alto, e também há muitas pessoas que perguntam que língua o turista fala, ou prefere falar. Também há homens e mulheres que falam alemão e que, ao perceber que sou suíço, querem praticar comigo a língua do meu país. Neste caso, fica claro que eu devo adaptar-me aos desejos dos interlocutores.
Não é minha intenção escrever um texto sarcástico. Tivemos contactos muito positivos com pessoas portuguesas, tivemos muitas conversas agradáveis e enriquecedoras, por exemplo, com duas donas de hotel, com alguns empregados, com taxistas, etc. Percebi mais uma vez que rica é a língua portuguesa, e quantas maneiras existem de falá-la, quantas palavras, quantas expressões existem que eu não conheço. Em cada aldeia, cada cidade, cada bairro, cada bar, o português tem a sua cor, a sua música, o seu ritmo próprios. Às vezes tive a impressão de estar em casa, outras vezes longe na África ou na China. Resumindo e concluindo: ainda estou longe de saber bem o português, o meu processo de aprendizagem apenas começou.