«Se eu isse», «se eu ir»? – não, as formas corretas são, respetivamente, «se eu fosse» e «se eu for». À volta dos usos do português de Angola, o texto que se segue aborda as conjugações dos verbos irregulares ser e ir, dando particular atenção às formas do imperfeito e do futuro do conjuntivo. Crónica de Edno Pimentel publicada no semanário luandense Nova Gazeta do dia 10/09/2015.
O resultado certamente seria diferente deste que vejo. Numa sociedade sólida, como defende o sociólogo polaco Zygmunt Bauman, «a escola era um espaço que tinha como propósito estabelecer a ordem». Não tenho dúvidas de que se tivesse ido à escola haveria ordem no modo de tratar da língua. Embora nos nossos tempos haja uma infinidade de meios para termos acesso ao conhecimento apenas com um clique.
Paulo Freire defendia com unhas e dentes que os alunos não se deviam submeter aos chavões alienados de muitos professores, que depositavam – muitos deles ainda depositam – o que bem entendiam, como se de banco se tratasse.
Um estudante, sobretudo universitário, tem de ter a curiosidade e capacidade de criar a sua própria educação para seguir o próprio o caminho e não copiar tudo o que já foi construído.
O kota Mã Marela, professor de português há mais de 30 anos, recomenda que todos os alunos, independentemente da sua área de formação, tenham uma ‘Maria Relvas’ (a gramática de José Maria Relvas), para aprenderem a conjugação correcta dos verbos. Sobretudo aqueles mais difíceis, como é o caso do verbo ir, que, em alguns tempos, muito se assemelha ao verbo ser. «Eu fui à escola» (verbo ir); «Eu fui estudante» (verbo ser); «Se eu fosse à escola» (verbo ir); «Se eu fosse estudante» (verbo ser); «Quando eu for à escola» (verbo ir); «Quando eu for grande» (verbo ser). Maria Relvas, permitam-me a metonímia, tem tudo isso bem detalhado, para não falar da Nova Gramática do Português Contemporâneo de Celso Cunha e Lindley Cintra.
Os verbos ir e ser são os dois verbos mais irregulares que a língua portuguesa possui, quer do ponto de vista do paradigma quer do ponto de vista do radical, que quase não aparece nas suas formas conjugadas.
Se os verbos são ir e ser, de onde vieram as formas do futuro do conjuntivo (se eu for; se tu fores; se ele for; se nós formos; se vós fordes; se eles forem) e do pretérito imperfeito do conjuntivo (se eu fosse; se tu fosses; se ele fosse; se nós fôssemos; se vós fôsseis; se eles fossem)? Ninguém é obrigado a saber de onde vieram, mas devemos saber que as formas correctas usadas actualmente são aquelas que as gramáticas de referência apresentam. E uma delas é «se eu fosse à escola», e não «se eu isse»...
Crónica da autoria de Edno Pimentel e publicada na coluna Professor Ferrão do jornal luandense Nova Gazeta, em 10/09/2015. Manteve-se a ortografia conforme a norma ainda aplicada em Angola, a qual é anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.