Compêndio de Gramática Portuguesa, de Nunes de Figueiredo. Era este o meu livro de cabeceira durante a minha infância, que acalentava o meu sonho de vir um dia a ser professora. Qual romance histórico ou romântico, urbano ou realista! Eram os verbos e as orações que me faziam sonhar!
Sempre acreditei que o meu caminho profissional passaria pelo ensino. O ensino da gramática, nua e crua. Bem sei que parece loucura, mas sempre me interessaram as especificidades e vaidades desta língua que é tão minha, tão portuguesa, por meio da qual expresso o que me vai na alma, as minhas emoções, sonhos e ambições!
Do quarto para a sala, reunia as bonecas e obrigava-as a conjugar os tempos verbais do modo indicativo, «na ponta da língua»! Sim! Descortinar a diferença entre o indicativo e o conjuntivo é um aborrecimento para qualquer pessoa, mas para mim fazia as delícias do meu eu, já a tentar ser uma professora de verdade.
Da sala de aula improvisada, passei para uma sala de aula a sério, na Faculdade de Letras, onde abracei o único curso que me poderia fazer plenamente feliz – a Linguística. Um terror para muitos; pura felicidade para mim! Foram 4 anos de alfabetos fonéticos, paradigmas lexicais e muita, muita amizade sintática! E foi justamente pela sintaxe que verdadeiramente me apaixonei e à qual ainda hoje sou fiel.
O palco seguinte foi ainda mais a sério, quando, aos 22 anos, me estreei como professora de verdade, no ISEC, a casa que ainda hoje me ouve falar de pronomes, adjetivos e interjeições. Nunca mais esquecerei esse meu primeiro dia, em que tomei verdadeira consciência da minha nobre missão: a missão de ensinar e de formar professores, mostrando-lhes a importância de tratar por tu a língua portuguesa; a importância de falar e de escrever com rigor e correção. Mostrando-lhes que fazer um bom uso das palavras não significa o mesmo que fazer um uso bom das mesmas.
Anos mais tarde, essa missão ultrapassou a sala de aula e passei a falar de gramática através de um microfone! A RTP acolheu-me em sua casa, dando-me tempo de antena para partilhar a paixão que fruo pela língua portuguesa e por estas lides gramaticais!
E se tivesse de escolher uma palavra que define a minha forma de estar no ensino, seria essa mesmo – PAIXÃO. É que só sei ensinar assim; não sei fazê-lo de outra maneira.