Achei muita graça a este segundo artigo do Dr. Vasco Graça Moura, publicado no DN do dia 15. Ele confirma o que já designei em anterior artigo por «visão catastrofista».
Apresenta neste texto argumentos, de carácter mais prático, que evidenciam os efeitos maléficos da TLEBS no quotidiano dos portugueses e não só. Saindo do plano científico «(não interessa se discutível ou indiscutível)», o Dr. V. G. M. centra-se nas implicações de ordem prática que decorrem da aplicação da TLEBS.
Como se não bastasse a «impreparação» dos professores — facto assente e irremediável — há ainda um rol de desgraças a anunciar:
1. Para o Dr. V. G. M., o problema central reside nos manuais escolares: «se a TLEBS começar a ser consagrada nos manuais, as coisas tornam-se irreversíveis porque os editores de livros escolares não quererão, depois, ver desperdiçado o investimento que fizeram...».
2. Depois, preocupa-o a contenção do dispêndio das famílias com os ditos manuais, «esse fluxo derrancante* das economias familiares»
3. Por último, garante o autor do artigo: «Numa área como a da aprendizagem da língua materna, em que a família tem um papel extremamente importante e em que muitos pais colaboram regular e validamente com os filhos ajudando-os a estudar, vai tornar-se inviável que o façam».
4.Adverte ainda o Dr. V. G. M. que, por causa da TLEBS, os PALOP africanos vão passar a cooperar apenas com brasileiros. «Já se pensou na trapalhada sem nome que a TLEBS ali vai gerar? Na confusão indescritível em que professores e alunos africanos vão ser lançados?» O Dr. V. G. M. não refere os efeitos desastrosos na cooperação com Timor, provavelmente para não preocupar ainda mais a Sr.ª Ministra da Educação, mas prevejo o pior: a contratação de professores australianos...
5. No tocante à aprendizagem de línguas estrangeiras, a confusão de nomenclaturas vai também inviabilizar a aprendizagem do inglês, logo nos primeiros anos do Ensino Básico, talvez porque os ingleses em vez de "nome" dizem "noun", em vez de verbo dizem "verb" e por aí fora...
Conclui: «A estratégia irresponsável de quem, no Ministério, paraninfa** tão zelosamente estas bizarras inovações está à vista.»
Vocabulário Como estava a ler um artigo num jornal de grande tiragem, estranhei a dificuldade em interpretar com rigor as frases 1. e 2. Envergonhada da minha impreparação, fui consultar um dicionário.
1. «esse fluxo derrancante das economias familiares»
*derrancante-
Fui procurar o Verbo que me pareceu ser a forma de base (TLEBS) da qual derivou o adjectivo.
derrancar
v. tr., estragar; alterar; corromper; irritar; fig., perverter; v. refl., corromper-se; tornar-se rançoso;tornar-se hidrófobo; enfurecer-se. (Priberam)
Como hei-de interpretar? "Fluxo" estragado/alterado/corrompido/irritado/pervertido/que se corrompeu/tornado rançoso/tornado hidrófobo/enfurecido? Qualquer um serve, mas confesso que gosto de ler preto no branco.
2. «A estratégia irresponsável de quem, no ministério, paraninfa tão zelosamente estas bizarras inovações está à vista».
** Paraninfa (Prés. Ind. do V. Paraninfar): eu paraninfo, tu paraninfas, ele paraninfa, nós paraninfamos.........«Já paraninfaste hoje?» ...
Paraninfar
v. tr. apadrinhar na cerimónia de baptismo. (Priberam)
Se bem interpreto, o que o Dr. V. G. M. diz é que alguém (indeterminado), no ME, apadrinha zelosamente estas inovações (a TLEBS). Diz ainda que estas são bizarras (esquisitas) e que esse alguém segue uma estratégia irresponsável. O que ele quer dizer e que se sobrepõe a tudo o resto que pelo o meio vai dizendo, é que a tal estratégia (sujeito) está à vista (predicado), donde se inefere que só não vê quem não quer ver ou então que há pessoas que fingem que não vêem. Eis-nos mergulhados na teoria da conspiração.
Escrever/ler um simples artigo de jornal será mais fácil quando toda uma geração de portugueses que frequentou pelo menos os ensinos básico e secundário — os muito eruditos e os menos — tiver interiorizado de forma consistente os princípios orientadores que regem a comunicação verbal. A TLEBS, nos seus vários domínios, não é uma bizarria, é uma necessidade, como se vê.