O português à mistura com o ucraniano, o árabe, o urdo, o turco, o hindu, o mandarim, o inglês, o francês e o espanhol – a sala de aula pode ser um centro de línguas, mas em versão rudimentar com base no Google Tradutor. É a realidade crescente das escolas públicas portuguesas, do ensino básico e secundário, onde os professores acumulam turmas multilingues (sem formação específica para tal), devido ao maior fluxo migratório.
De ano para ano, chegam a Portugal mais filhos de trabalhadores indiferenciados, de nómadas digitais e de refugiados. Aos professores cabe a tradução instantânea. Improvisam como podem, com vários sumários e recurso a tradutores online em português do Brasil (falíveis). Mais: falam devagar, encurtam os textos dos enunciados dos testes, tentam fazer-se entender às vezes num inglês básico, noutras em “portunhol”.
«É mesmo uma Torre de Babel. Permitimos que o aluno use ferramentas de tradução, o que nem sempre é confiável, principalmente nas Ciências Exatas ou na Física», observa um dos professores da área do Português Língua Não Materna (PLNM) ouvidos num trabalho* da revista Sábado do dia 10 de novembro de 2022, assinado pela jornalista Raquel Lito, sobre este assunto .
Nele se descreve o que está longe de funcionar para a desejada inclusão destes estudantes estrangeiros. 100% por escassez de recursos: faltam materiais de apoio, misturam-se alunos com diferentes níveis de conhecimento linguístico, do inicial (A1, não falam uma palavra de português) ao intermédio (B1, têm alguma fluência), e, muitas vezes, só recebem 90 minutos semanais de apoio. Além da dificuldade na gestão dos horários das disciplinas com alunos PLNM, muitos deles recém-chegados com alfabetos diferentes do nosso (caso dos ucranianos, dos árabes e dos chineses) a requerer muito maior acompanhamento.
Lacunas que se repetem de norte a sul do país. Por exemplo, no Algarve, que começou a receber vagas sucessivas de migrantes, desde 2017: primeiro, nepaleses; depois, argentinos, argelinos, venezuelanos; e, desde a guerra da Rússia, ucranianos.
*Texto na integra, com a devida vénia, acessível aqui.
Cf. Pandemia: Os dramas dos miúdos que não sabem ler nem escrever + Alunos ucranianos lamentam poucas aulas para aprender português + Como falhou a ligação entre o Governo e a escola
Texto da revista Sábado, do dia 10 de novembro de 2022, da autoria da jornalista Raquel Lito