Comentou-me ilustre amigo, intrigado, mas também algo indignado pelo facto da pera-melão, no seu entender, excelente fruto, não se encontrar exposta para venda nas grandes superfícies comerciais. Qual a razão?
Ora, não nos podemos esquecer que as vendas nos supermercados de géneros alimentícios e outros não obedecem prioritariamente a critérios de utilidade para os consumidores. Na verdade, são os lucros que presidem às vendas, baseando-se em negocismos que, quase sempre não olham a meios, padronizados em sofisticadas técnicas, para aliciar os incautos clientes.
A utilidade dos produtos reveste, para os galifões do grande comércio, mero valor residual. Desculpem-me os leitores porventura enfastiados por este começo abrupto, mas achei que seria oportuno chamar a atenção para este fenómeno, cada vez mais crasso que gera um crescente consumismo exacerbado. As criaturas indefesas, em face da máquina trituradora dos órgãos mediáticos, são quotidianamente bombardeadas com mentiras sucessivas que, de tanto massacrar, acabam por se tornar “verdades” absolutas. Os anúncios televisivos despejados em catadupa, nos intervalos dos programas (estes mesmos quase todos estupidificantes), tratam os espetadores que não se dão ao trabalho de pensar, como ingénuas criancinhas.
O introito, que tomei a liberdade de aduzir, pretende tão somente despertar o sentido crítico que cada cidadão deve manejar para resistir e ajudar a mudar algo que está mal nesta ignóbil sociedade capitalista. Já repararam que nas épocas de aguda crise em que quase toda a gente perde proventos redutores da sua qualidade de vida, vemos os detentores dos megassupermercados a arrebanhar lucros cada vez mais chorudos?
Adiante, se não há pera-melão à venda é porque não encontraram (ainda) a maneira de lucrar com o negócio!
A planta da pera-melão, que dá pelo nome de Solanum muricatum, não é de cá. Ela proveio dos vales andinos da América do Sul e o seu fruto tem sido consumido desde épocas remotas pelos indígenas locais. Devido às graduais alterações climáticas e ao seu “bom feitio”, esta planta tropical tem-se expandido e naturalizado nas latitudes temperadas de vários continentes.
Aconselhado para sumo, salada ou como fruta fresca
Acentuo o termo “bom feitio” porque tal Solanacea enraíza de estaca com toda a facilidade e é de crescimento rápido. Plantei-a no mês de agosto e ei-la que já brota viçosa e florida em pleno outubro. De resto, ela gosta de solos com pH acima de 6, ou seja, alcalinos e com boa drenagem, mas detesta geadas.
A planta é herbácea e arbustiva com caule ligeiramente lenhoso, podendo atingir 1 m de altura. As folhas são alternas, pecioladas e simples, tendo, contudo, por vezes, folíolos laterais. As flores são violetas, pentâmeras e hermafroditas, sendo polinizadas por insetos. Os frutos, verdes quando imaturos, adquirem coloração amarela com estrias púrpuras e forma oval, pesando 300 ou 400 gramas, ou até mais. A casca não passa de uma película fina. A polpa é amarela, macia, sumarenta e aromática. As sementes são minúsculas.
A pera-melão é muito refrescante, contendo cerca de 92% de água. É rica em vitamina C e possui também caroteno, tanino, potássio, cálcio, fósforo, açúcares e compostos antioxidantes.
Pode-se consumir em sumo, salada ou como fruta fresca se for bem madura. O sabor adocicado faz lembrar o do melão.
Propriedades: antidiabética, anti-inflamatória, diurética e depurativa. Combate a prisão de ventre, fortalece o sistema imunitário, previne o envelhecimento precoce e ajuda a perder excesso de peso.
Consultei The Great Exotic Fruit Book, editado na Califórnia, mas, curiosamente, impresso na Coreia, que faz alusão ilustrativa a 74 frutos que os americanos consideram exóticos, entre os quais a nossa pera-melão, a qual apelidam de pepino.
Há igualmente quem a designe por pepino-doce, melão-pepino, melão-andino, tomateiro-francês e muricato. Esta última expressão vem da palavra latina muricatum, cujo significado deriva do facto de as folhas serem ásperas.
Integra igualmente o Gran Diccionario das Plantas Medicinales, de Josep Lluis Berdonces.
O III volume da Fruticultura Tropical – Espécies com frutos comestíveis, de José Mendes Ferrão é, contudo, a obra que achei com mais substância. Este saudoso cientista português, recentemente falecido, dedica-lhe três páginas no seu precioso livro editado pelo Instituto de Investigação Científica Tropical, em 2002.
Do autor, transcrevo, com a devida vénia, uma pequena parte para aguçar o apetite dos curiosos:
«O valor energético é relativamente baixo, mas são muito notáveis as suas qualidades refrescantes e diuréticas. É recomendado na prevenção do bócio, possivelmente devido aos altos teores de iodo que doseia.»