Artigo de Maria Regina Rocha publicado no Diário do Alentejo, na coluna "A vez ao… português", de 31 de Outubro de 2008, à volta de quatro palavras da área vocabular da Igreja Católica.
(…) Igreja é uma palavra proveniente do grego e que chegou ao português pelo latim ecclesia. Em grego, a palavra era formada pela preposição ek e pelo verbo kaléo («chamar»), e significava «assembleia», «chamada», «conjunto dos chamados, dos convocados», tendo adquirido em latim já o significado de «assembleia de fiéis». Em português, manteve este significado, passando depois também a designar o templo onde os fiéis se reuniam.
A palavra bispo também provém do grego, epískopos, com o significado de «aquele que observa». Aquele que observa superiormente tem à sua responsabilidade os outros prelados e o conjunto das paróquias. Na palavra é visível o radical skopein (= observar), presente, por exemplo, nas palavras periscópio (para observar o que está à volta), telescópio (para observar o que está longe), microscópio (para observar o que é pequeno).
Uma palavra muito curiosa é ministro, que tinha o sentido de servidor, subordinado, criado. Ministro provém do latim ministrum, acusativo de minister (o acusativo é um dos casos do latim, ou seja, uma das formas que a palavra tomava consoante a função sintáctica que desempenhava na frase). Ora ministrum tem como componente minus (menos), em oposição a magis (mais): minus, ministrum (ministro, o servidor, o criado, o oficial inferior), magis, magistrum (mestre, o que comanda, o que conduz, o que dirige, o que ensina). A palavra sofreu, depois, uma nobilitação semântica, passando a designar, ainda no paganismo, «ministro de uma divindade, sacerdote, intermediário entre os homens e a divindade», significado com que entrou no português. A introdução do vocábulo na linguagem política é mais recente: o ministro começa por ser «o que exerce emprego e ofício de Justiça, ou de Fazenda, ou político, ou evangélico», ou seja, alguém «debaixo da subordinação dos soberanos e dos prelados (subentendendo-se, neste último caso, do próprio Deus, valor atestado na expressão «ministro do culto»). Depois, esse valor de subordinação, de sentido de servir, deixou de estar em primeiro plano, para avultar o de responsável máximo por um ministério, com todo o poder de decisão.
A palavra missa provém do latim e significava o «acto de deixar sair, de permitir que alguém se vá embora», a «despedida». Efectivamente, missa é uma palavra latina derivada do verbo mitto, que significava deixar ir, deixar partir, soltar, largar. É que, originariamente, depois do sermão (uma das partes da missa) e antes do ofertório (outra das partes da missa, em que o sacerdote oferece a hóstia e o cálice a Deus), os catecúmenos eram convidados a sair da celebração eucarística com as palavras Ite, missa est (= «Saí, é a despedida»). Os catecúmenos eram aqueles que se preparavam para receber o baptismo: como ainda não estavam baptizados, ainda não eram cristãos, não estavam presentes na totalidade da celebração. Depois, a palavra passou a designar em geral a celebração eucarística. (…)
in Diário do Alentejo, 31 de Outubro de 2008