Mandam as regras da mais elementar prudência que antes de fazermos afirmações peremptórias saibamos do que é que estamos a falar.
No meio das dezenas de notícias e comentários que estão a ser publicadas a propósito da visita do dalai-lama [a Portugal], li, no Público, uma notícia assinada por Leonete Botelho, na qual a autora afirma que «Kenzin Gyatso» é «o nome de nascença do Dalai Lama e aquele que os apoiantes de Pequim utilizam».
Deixando de lado os pormenores de que a transliteração correcta é Tenzin, e não Kenzin, e que dalai-lama tem, em português, um hífen, fica a autora esclarecida de que Tenzin Gyatso não é o nome de nascença do dalai-lama, mas, sim, o seu nome religioso. O seu nome de nascença é Lhamo Dhondup. Eu sou um dos que «utilizam» o nome Tenzin Gyatso, embora a única coisa de Pequim de que sou apoiante incondicional seja o pato à Pequim.
Espero, sinceramente, que o gabinete de Sua Santidade não leia uma transcrição desta notícia, pois ficariam a pensar que Leonete Botelho está convencida de que são um bando de «apoiantes de Pequim». O que, presumo, os deixaria muito preocupados, tanto mais que o sítio oficial do dalai-lama está cheio de menções a Tenzin Gyatso.
O próprio Tenzin Gyatso tem o cuidado de separar a sua pessoa das funções que desempenha, como está patente na resposta que abaixo se transcreve1 de uma das muitas entrevistas que lhe fizeram. E Tenzin Gyatso, pode Leonete Botelho ter a certeza, não é apoiante de Pequim.
1Question: Will you be the last Dalai Lama?
Answer: Whether the institution of the Dalai Lama remains or not depends entirely on the wishes of the Tibetan people. It is for them to decide. I made this clear as early as in 1969. Even in 1963, after four years in exile, we made a draft constitution for a future Tibet which is based on the democratic system. The constitution clearly mentions that the power of the Dalai Lama can be removed by a two-thirds majority vote of the members of the Assembly. At the present moment, the Dalai Lama’s institution is useful to the Tibetan culture and the Tibetan people. Thus, if I were to die today, I think the Tibetan people would choose to have another Dalai Lama. In the future, if the Dalai Lama’s institution is no longer relevant or useful and our present situation changes, then the Dalai Lama’s institution will cease to exist.Personally, I feel the institution of the Dalai Lama has served its purpose. More recently, since 2001 we now have a democratically elected head of our administration, the Kalon Tripa. The Kalon Tripa runs the daily affairs of our administration and is in charge of our political establishment. Half jokingly and half seriously, I state that I am now in semi-retirement.