A propósito do funcionamento de telemóveis e operadoras em Angola, Edno Pimentel assinala o erro "códico", que ocorre em lugar da palavra correta, código.
Nos últimos tempos, as pessoas já “não sabem” por que operadora optar. Queixam-se das que andam por aqui [em Luanda]. Dizem que estão «cheias de planos e promoções», no entanto, «são propagandas que já não surpreendem a ninguém».
Estão várias vezes sem sinal, apresentam cortes sucessivos, a internet é lenta que nem o trânsito de Luanda, para não falar das UTT (Unidades de Tarifários Telefónicos), que "evaporam" em algumas chamadas de poucos minutos.
Essas são queixas de alguns clientes que se dizem «agastados» até com a «falta de profissionalismo» dos assistentes dos centros de atendimento, ou apoio ao cliente, que «ficam mais preocupados a enrolar a língua», talvez para impressionar quem os ouve, e «esquecem-se de tratar dos problemas para os quais foram contratados».
«”Fala comigo”. Eu não quero falar contigo. Falo com quem eu quiser. Foi para isso que comprei o meu telefone», resmunga um mais-velho ao ouvir o toque de espera de uma das operadoras.
«Esse "próximo mais próximo" parece estar cada vez mais distante das pessoas. Estouram o meu saldo mesmo quando eu não falo», queixa-se outra cliente, que tentava carregar o telemóvel há dois dias, mas sem sucesso.
«É isso que acabei de explicar, menina. O saldo do meu cartão não entra. Vê, por favor, qual é o problema», roga a senhora com um lenço molhado de suor, depois de ter passado por três agências que não tinham sistema.
«Mãezinha, acho que o "códico" é que está errado», sugere a jovem do apoio ao cliente.
«Não pode, menina», exclama. «Comprei dois cartões, um para mim e outro para o meu filho. O dele funcionou. Como é que o meu está errado?», pergunta indignada. «O teu "códico", com certeza, é que está errado, porque o meu código está certíssimo», corrige a mais velha já muito chateada.
E não era para menos. O cartão tinha saldo de 1250 UTT e custou 9000 kwanzas. «Desculpa, minha filha, mas não vou sair daqui sem resolver este problema».
Quando chegou, o supervisor deu conta, pelo número de série, de que havia um algarismo que, de tanto raspar o cartão, parecia 1, mas era, na verdade, um 7.
«O certo é o código 415 745… e não o "códico" 415 145…», explicou o supervisor.
Apesar de provir do latim codĭcu,1 em português a palavra evoluiu para código. A consoante velar surda /k/ (codĭcu), com o tempo, ganhou sonoridade e passou a pronunciar-se /g/, como nas palavras advogado’ e antigo.
1N. E. – A palavra código não provém diretamente do latim clássico codex, -icis, mas antes de uma forma latina medieval: «segundo [Joan] Corominas, lat. codex, ĭcis "escrito, registro, livro" aplicado por antonomásia ao código de Justiniano e depois a outras fontes legais; esta terminação em -o, que ocorre também no espanhol código e no italiano antigo codico talvez proceda do grego kôdikos, genitivo do latinismo grego kódiks, ikos, entrando nas línguas românicas através da Itália bizantina [...].»
in semanário Nova Gazeta, de Luanda, publicado no dia 8 de maio de 2014 na coluna do autor, Professor Ferrão. Manteve-se a grafia anterior ao Acordo Ortográfico, seguida ainda em Angola.