Nas duas primeiras reuniões da Assembleia de Freguesia, após as eleições autárquicas de Dezembro do ano findo, foi discutida a grafia do nome da nossa terra, Cavez: uns, porque se escreve com z, Cavez; outros, porque se escreve com s e acento circunflexo, Cavês.
Esta polémica já vem de meados do ano de 1986, quando eu próprio levantei a questão por saber que no Diário do Governo de 8 de Dezembro de 1945, ponto III, página 1038, se lê o seguinte: "Não se consentem grafias duplas ou facultativas. Cada palavra da Língua Portuguesa terá uma grafia única. Não se consideram grafias duplas as variantes fonéticas e morfológicas de uma mesma palavra".
Por aqui se vê que uma das formas é errónea, e só pode ser a que se escreve com s e acento circunflexo, Cavês. Esta grafia, a mais usada pelos funcionários públicos do concelho de Cabeceiras de Basto, provavelmente fruto colhido na 1ª. classe do Ensino Primário, já que houve, e ainda há, professores do Ensino Básico que insistem que a palavra Cavês é assim: e, uns e outros, nunca procuraram saber qual a forma correcta, podendo evocar-se o ditado popular "Maria vai com as outras".
As pessoas afectas à grafia Cavês (com s e acento circunflexo) dizem que se deve escrever como começou. A forma mais antiga é de 1248 ou 1258, mas não sabem que houve dois períodos da História da Ortografia Portuguesa, o primeiro que começa com os principios da Língua e dura até ao século XVI, considerado Fonético; outro, denominado Pseudo-Etimológico, que se estende do século XVII aos nossos dias.
Foi nesta base que o grande historiador Alexandre Herculano escreveu, nos índices da "Portugaliae Monumenta Historica", o nome da nossa terra com a grafia Cavez, por considerar esta a forma mais correcta, depois de já ter escrito Caves como a encontrou na "Segunda Alçada das Inquirições Gerais de Afonso III", de 1258.
Mas, para se fazer uma ideia de como as pessoas têm navegado ao longo dos tempos, sem saber em que mar ou rio, isto só acontece cá por estes lados.
Atentemos nisto: Nos livros de actas da Junta e Freguesia, alguns ainda existentes, os mais antigos começam em Março de 1863, que, com reuniões regulares até Março de 1882, o nome da freguesia foi sempre grafado com z. Nos dois anos seguintes, 1883-1884, a palavra aparece assim, Cavês; de 1885 a 1888, aparece Cavez; de 1889 a 1895, se vê Cavês; desde 1896 a 1942, é Cavez; em 1943-1944, volta a ser Cavês, para em 1945, ser Cavez; desde; desde 1946 até hoje, escreveu-se Cavês, não obstante a palavra Cavez, com esta grafia, estar em tudo o que é oficial.
Senão, vejamos. Nos arquivos paroquiais, desde o fim do século XVIII, até aos nossos dias; nos arquivos da arquidiocese de Braga; gravada nos sinos da igreja paroquial (S. João Batista da freguesia de Cavez); também na capa dos livros de registo das Finanças de Cabeceiras de Basto, referentes a Cavez; no posto da Delegação de Saúde; na carrinha da Assistência Social; no carimbo dos Correios; nos selos brancos da Junta de Freguesia e da Paróquia; nos itinerários e nos bilhetes passados aos utentes da Rodoviária de Entre Douro e Minho, na "Lista das Juntas de Freuguesia", da Associação Nacional de Freguesias, edição nº. 1, ano 1997/8, na "Actualização do Recenseamento Eleitoral", de 1996, do S.T.A.P.E. e, ainda, no jornal da terra, o "B.I.C.", que ostenta orgulhosamente a palavra Cavez.
No Grupo Desportivo da nossa terra, vêem-se as duas grafias, assim como no Clube de Caça e Pesca, provenientes da teimosia, vaidade e ignorância de algumas pessoas. Mas, como atrás disse, isto só em Cavez!
A palavra Cavez esteve nas placas da E.N. nº. 206, indicando a localidade, desde a sua construção, 1860-1880, até 7 de Novembro de 1997, altura em que a Direcção de Estradas de Braga colocou novas placas, agora com a grafia Cavês.
Isto não lembra ao Diabo! É certo que foi para fazer a vontade a alguém, mas também é verdade que poucas pessoas percebem os problemas ortográficos. O Director de Estradas de Braga, certamente com formação universitária, tem mesmo esses problemas, que eu, com a 4ª. classe, me orgulho de não ter.
Agora, vai ter de se retractar e mandar lá colocar a palavra que sempre teve: Cavez, porque é a correcta. E nós queremos o nome da freguesia sem erro.
Mas, não fiquemos por aqui. O ano de 1997 foi o ano dos cavesanos, ou cavesinos, que é gentílico dos naturais de Cavês (porque os que escrevem Cavez não querem o gentílico que pertence ao povo do Gerês; querem ser cavecenses, como os de Estremoz são estremocenses). Mandaram fazer um brasão para a freguesia em que o desenho é bonito, e aqui tudo bem, mas a maioria das pessoas que compunham os órgãos autárquicos do ano passado escrevia Cavês, com s e acento circunflexo. A Comissão Heráldica deu parecer favorável a esta grafia, mas agora terá que voltar atrás, já que, assim, o brasão não tem qualquer valor. Mas desse problema vão tratar a Junta e a Câmara.
A palavra Cavez não entrou, nem podia entrar, nas reformas ou acordos ortográficos, como alguém quer fazer crer. Veja-se o exemplo do topónimo Valdevez, cuja última sílaba é de origem latina (vez, de vice). Como se vê, o z português a representar o c latino, para além do e fechado ter o mesmo valor fónico: Valdevez / Cavez.
Já se encontra na Academia das Ciências de Lisboa uma exposição sobre este assunto, que aguardamos seja favorável à grafia de Cavez. E, dado o valor dessa instituição, a resposta não pode ser outra!
E os senhores funcionários públicos do concelho, seja qual for a sua especialidade ou curso literário, devem escrever a palavra correcta, para que a Língua seja mais universal.
Texto publicado no jornal português "24 horas" no dia 28 de Maio de 1998.