Três questões a responder:
1.ª Qual é a origem de prerrequisitos?
2.ª Prerrequisitos e pré-requisitos significam ou não o mesmo?
3.ª Como escrever actualmente?
A palavra prerrequisito aparece registada, como disse, no Grande Dicionário da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado (ed. de 1989), bem como na 10.ª edição do Grande Dicionário da Língua Portuguesa, de António de Morais Silva (1949-1958), e na Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, em todos eles com o mesmo significado. Transcrevo aqui o verbete da enciclopédia, por ser o mais completo:
Palavra empregada pelos filósofos escolásticos para designar certo género de condições que eles entendiam se requerem nas causas para poderem exercer o seu influxo causal, sem que por isso constituam propriamente a virtualidade que influi no ser para a produção do efeito. Concebem que, sem estes prerrequisitos, a causa se não acha proximamente expedita para actuar. Dividem os prerrequisitos em positivos e negativos, consistentes estes últimos na remoção dos impedimentos que ligam a virtude produtiva. Entre os prerrrequisitos incluíam o decreto divino aplicativo da omnipotência para concorrer com as causas segundas. (Cf. Suárez, Disputationes metaphysicae, disp. 18).»
Segundo o prof. doutor Mário Santiago de Carvalho, da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra – cujo precioso contributo agradecemos –, o termo latino praerequisitum encontra-se, de facto, na obra de Francisco Suárez (1548-1617), Disputas Metafísicas, disputa n.º 18, secção 7, parágrafo 1. O termo ocorre, pois, na discussão da temática da causalidade e, mais em concreto, na secção que discute se a causa eficiente, para poder actuar, se deve distinguir do suporte da acção. Assim, ao tratar das causas, o jesuíta espanhol indica que todo o agente criado necessita de um paciente (o suporte ou substrato da acção). O pressuposto desta afirmação é a ideia de que só se pode criar (actuar) a partir de uma dada matéria (para o autor, só Deus cria a partir do nada). Depois, indica que as condições requeridas (requisitae) para que se dê a acção não se encontram entre a causa e o efeito. O pressuposto desta afirmação é o de que, se se encontrassem entre a causa e o efeito, já não seriam condições, mas sim consequências. Exigem-se antecipadamente (praerequisitae), então, 3 condições, entre o agente e o paciente ou entre a causa eficiente e a material, a saber: a própria distinção entre agente e paciente, a necessária proximidade entre eles, a dissemelhança ou proporção que é característica de uma actividade ou operação. Em resumo: o termo latino praerequisitum é um termo técnico da filosofia da causalidade exigido pela necessidade de analisar ou ver claro a relação entre causa e efeito ou entre causa eficiente (o que faz) e causa material (aquilo sobre que algo é feito).
O termo prerrequisito não é utilizado na filosofia contemporânea; o seu uso restringe-se à história da filosofia da causalidade.
Segundo o Acordo Ortográfico de 1945, base XXIX, ponto 16.º, formam-se por prefixação com hífen as palavras «com prefixos que têm acentos gráficos como além, aquém, pós (paralelo de pos), pré (paralelo de pre), pró (com o sentido de "a favor de"), recém».
Existe actualmente o termo pré-requisito, registado no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, e no dicionário Novo Aurélio Século XXI (ambos de 1999). O mais recente dicionário publicado em Portugal, o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa (2001), não o regista, o que não é de admirar, dado o facto de este dicionário ser muito incompleto, não registando um grande número de vocábulos em uso. Significa este termo «requisito básico, primordial, condição prévia», e não está circunscrito à filosofia.
Assim, à pergunta se os termos significam o mesmo, respondo que não. O primeiro tem um significado restrito (utilizado no âmbito da filosofia e numa determinada época), enquanto o segundo tem um significado geral.
Deverá escrever-se pré-requisito, seguindo o previsto no Acordo Ortográfico em vigor, correspondendo essa grafia à utilização do prefixo na sua forma tónica.