A vírgula tem diversas funções, como pode comprovar pela consulta de muitas das nossas respostas anteriores. Há casos em que antes de e, de mas, de ou e de nem não se deve colocar vírgula, e há situações em que ela faz muita falta, como essa referida na obra de Maria Rosa Costa. O exemplo apresentado pelo estimado consulente ilustra muito bem essa necessidade. É um caso em que a vírgula faz todo o sentido, sim! Há aí duas orações distintas: «O João comeu uma maçã» + «A Maria bebeu um sumo». Se puser simplesmente um e a seguir à primeira oração, o que se espera é que ele faça parte dessa mesma oração, como neste exemplo: «O João comeu uma maçã e um bolo.» Assim, se não puser a vírgula, dá-se azo a uma leitura algo embaraçosa: «O João comeu uma maçã e a Maria...» Faz falta a indicação de que a primeira oração terminou, indicação essa que pode ser dada pela vírgula.
Mais um exemplo em que a tal vírgula que lhe parece descabida faz, afinal, muita falta:
«Eu convidei a Ana e a Teresa e as gémeas foram convidadas pela minha irmã.»
Sem a vírgula, ninguém percebe quem é que eu convidei... nem quem foi convidado pela minha irmã, pois não? As duas orações poderiam ser: «Eu convidei a Ana» + «A Teresa e as gémeas foram convidadas pela minha irmã», mas também era possível que fossem: «Eu convidei a Ana e a Teresa» + «As gémeas foram convidadas pela minha irmã». É graças à vírgula, separando as orações coordenadas, que tudo fica claro. Essa vírgula deve colocar-se mesmo nos casos em que nenhuma ambiguidade parece haver («O livro é azul, e a borracha é verde»), do mesmo modo que devemos parar sempre no sinal vermelho, ainda que não venha lá nenhum carro.
É curiosa essa sua impressão de haver mais vírgulas actualmente do que há vinte anos*; sem me lembrar de como se escrevia nessa altura, a sensação que tenho é a de que cada vez mais se vai abdicando desse sinal de pontuação...
* É «há vinte anos», e não "há vinte anos atrás".