Desculpe-me, caro correspondente, mas merece um «puxão de orelhas» pelo mau português em que se nos dirige. Aconselho-o vivamente a ler muito, a pedir a alguém que lhe dite uns textos e lhe corrija os erros, a consultar frequentemente o dicionário ou prontuário que tenha à mão...Uns bons tempos neste regime conferir-lhe-ão outra legitimidade para emitir opiniões tão definitivas sobre o acordo ortográfico e o que acha certo ou errado na língua portuguesa. "Pernunciam" em vez de pronunciam; "Falamos coleção" em vez de dizemos coleção; "Língua brasileira" em vez de norma brasileira ou Português do Brasil; "Aonde" em vez de onde: há-de concordar que é um exagero de erros, num texto tão pequeno e tão opinioso.
Mas vamos à resposta propriamente dita. As consoantes mudas «c» e «p», existentes em palavras como director, accionista, baptismo, adopção, conservam-se no português europeu para indicar que a vogal anterior é aberta (dizemos dirètor, àcionista, bàtismo, adòção). De facto, no português europeu manifesta-se grande tendência para fechar as vogais que não fazem parte da sílaba tónica. Tomemos como exemplo a palavra telefone: pronunciamos as sílabas te-,-le-,-ne, com e mudo, e apenas a sílaba tónica com vogal aberta /fò/. No português do Brasil não existe essa tendência para o «fechamento» das vogais átonas, justificando-se deste modo o desaparecimento das consoantes «c» e «p» , quando não articuladas, como em ação, ótimo e correto.
Ambas as grafias têm, pois, justificação. E não é com o acordo ortográfico que «vamos ficar iguais aos brasileiros»: se o acordo for ratificado por eles e entrar em vigor, assistiremos, por exemplo, ao fenómeno bizarro de os portugueses passarem a escrever adoção, pois não lêem o p, e os brasileiros continuarem a escrever adopção, porque lêem o p! E lá se vai a uniformidade ortográfica.
Aliás, já reparou que os ingleses convivem pacificamente com a norma americana da língua que também é deles, sem se ralar nada com a diversidade ortográfica?