Soraia Valy Lourenço - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Soraia Valy Lourenço
Soraia Valy Lourenço
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Licenciatura em Línguística (com Ramo de Formação Educacional) e mestrado em LCP- Metodologia de Ensino de PLE/PL2 pela Universidade de Lisboa. pós-graduação em Estudos Pós-Coloniais. Leitora do Instituto Camões, na Universidade de Zagreb, Croácia. É autora do livro Um Quadro de Referência para o Ensino do Português em Timor-Leste (2011) e de artigos na área do Ensino e Aprendizagem de PLE/PL2.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Encontrei frases como as seguintes:

a) Há quinze dias a Joana zangou-se com a Rita.

b) Há um ano que estudo o português.

c) Comecei a estudar o português há um ano.

Gostaria de saber quando é que a expressão «há algum tempo» é seguida por que? Porque é que na frase a) não está esse que depois de «há quinze dias», seria por causa do tempo verbal? Ou seja, se for um verbo no pretérito perfeito, como é o caso das frases a) e c), seja como for a ordem da frase, não se pede o que? E ao contrário, quando o verbo estiver no presente, é obrigatório o que?

Obrigada!

Resposta:

Quando o verbo está no pretérito perfeito estamos na presença de um adjunto adverbial temporal com valor de localização temporal, como é o caso das frases a) e c). Nestes casos, estamos na presença de enunciados que nos dão uma localização no tempo, ou seja, de quando se deu a ação. Quando o verbo está no presente do indicativo estamos na presença de um adjunto adverbial temporal com o valor de duração, como é o caso da frase b). Neste exemplo, o enunciado dá-nos informação relativa à duração da ação.

A propósito do valor de duração e de localização dos adjuntos adverbiais temporais veja-se a Gramática do Português – Fundação Calouste Gulbenkian, pp: 560-577.

No que se refere à utilização da partícula que nos enunciados que apresenta, esta pode ou não ocorrer em todos eles quando a frase é introduzida por «há quinze dias»/«há um ano». No entanto, quando a frase é introduzida por outra expressão, como se verifica em c), a partícula que não é obrigatória. Nota-se que nos enunciados introduzidos por adjuntos adverbiais temporais com valor de duração, a utilização da partícula que é obrigatória.

a) Há quinze dias, a Joana zangou-se com a Rita. (valor de localização)

I. Há quinze dias que a Joana se zangou com a Rita.

II. A Joana zangou-se com a Rita há quinze dias.

b) Há um ano que estudo o português. (valor de duração)

I. Estudo (o) português há um ano.

II. * Há um ano estudo português.

c) Comecei a estudar o português há um ano. (valor de localização)

Pergunta:

Como perguntar: «de que gosta mais?», ou «do que gosta mais?»?

Muito obrigada.

Resposta:

 A dúvida prende-se com a utilização do pronome interrogativo que.

(1) «De que gosta mais?»

Em situações nas quais se pretende dar maior ênfase à pergunta, usa-se o que (Celso Cunha e Lindley Cintra, Breve Gramática do Português Contemporâneo, p. 247).

(2) «Do que gosta mais?»

Deste modo, as duas formas são consideradas corretas, dependendo da ênfase que se quiser dar à pergunta.

Pergunta:

Gostaria de saber se está correcto usar o advérbio de modo adicionalmente. Penso que este advérbio mais não é do que um aportuguesamento do advérbio de modo additionally.

Agradeço desde já a vossa disponibilidade.

Resposta:

De acordo com a pesquisa efetuada, considera-se que o uso do advérbio de modo adicionalmente é correto, uma vez que consta do Dicionário Priberam e do Portal da Língua Portuguesa como sendo um advérbio derivado de adicional. O dicionário da UNESP atesta a forma adicionalmente pelo menos desde 2004, com os significados de «em acréscimo» e «a mais».

No entanto, convém observar que adicionalmente também ocorre como articulador de texto, com o significado de «além disso», constituindo mero decalque do inglês addtionally. Este uso é discutível do ponto de vista normativo, e falantes mais ciosos da vernaculidade da língua rejeitam-no.

Pergunta:

Gostaria de pedir sugestões sobre manuais de português para estrangeiros segundo o novo Acordo Ortográfico.

Tenho o manual Português sem Fronteiras, mas não estou segura se não existe outro, mais recente, que seja actualizado segundo as novas normas.

Todo tipo de informações e conselhos será bem-vindo para nós, os estrangeiros, que desejamos aprender melhor a língua portuguesa.

Obrigadíssima!

Resposta:

A editora LIDEL, a principal distribuidora de manuais de Português Língua Estrangeira (PLE) em Portugal, tem estado a lançar novas edições de praticamente todos os manuais de PLE já existentes, especialmente aqueles que habitualmente são mais usados pelos professores de PLE, tal como o manual que a consulente refere, Português sem Fronteiras.

Deste modo, deixamos-lhe uma lista dos manuais que já possuem novas edições, as quais já vêm segundo a nova norma ortográfica. A lista consiste numa seleção dos manuais mais recentes no mercado, assim como novas edições daqueles que habitualmente têm mais procura no âmbito do ensino de Português no estrangeiro.

Lista de novos manuais de PLE e de novas edições de manuais já existentes no mercado:

TÍTULO (recente): Avançar em Português (Livro segundo o novo Acordo Ortográfico)

Autoras: Ana Tavares e Marina Tavares

TÍTULO (novas edições): Na Onda do Português 1 – Livro do Aluno (Livro segundo o novo Acordo Ortográfico)

Na Onda do Português 2 – Livro do Aluno (Livro segundo o novo Acordo Ortográfico)

Na Onda do Português 3 – Livro do Aluno (Livro segundo novo Acordo Ortográfico)

Pergunta:

Gostaria de ouvir a vossa opinião, fundamentada, sobre esta questão:

Deve dizer-se «quanto mais não seja», ou «quando mais não seja»?

Obrigada.

Resposta:

A maior parte das fontes bibliográficas pesquisadas1 não faz referência à expressão em apreço, contudo foi possível encontrar alguma informação sobre o assunto no Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, na obra de Maria Tereza de Queiroz Piacentini2 e no Dicionário de Barbarismos da Linguagem Corrente, de Francisco Alves da Costa, a qual pode contribuir para uma utilização mais esclarecedora da locução.

1 – Maria Tereza de Queiroz Piacentini esclarece que «as formas a utilizar deverão ser "quando mais não seja" e "tanto mais não seja", já que o cruzamento de quando e tanto é que leva a quanto.

Exemplos:

i. "Convém protestar, quando mais não seja para provar que estamos vivos."

ii. "Embora sonolenta, pretende recitar todos os versos de cor, tanto mais não seja para agradar à tia, empertigada na primeira fila do teatro"».

2 – O Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, por sua vez, só atesta a forma «quanto mais não seja», que pode ser parafraseada por «se outra razão não houver, ao menos».

3 – Francisco Alves da Costa refere a propósito de alguns discursos jornalísticos que as formas «mais que não seja», «que mais não seja» ou «quanto mais não seja» «são uma deturpação arbitrária da locução "quando mais não seja"».

Deste modo, um esclarecimento fundamentado nem sempre se torna possível quando as fontes disponíveis se revelam pouco esclarecedoras. Contudo, textos do século XIX evidenciam que «quando mais não seja» será anterior a «quanto mais não seja»:

«... e pedem com justiça a extincção da Junta, ou ao...