Maria Regina Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
Textos publicados pela autora

«Começa agora a desenhar-se os contornos da nova lei: período de reflexão curto, não há aconselhamento obrigatório e esta tónica de que o ministro da Saúde, pelo menos, quer que os abortos sejam feitos, prioritariamente, no Serviço Nacional de Saúde.»

Nesta frase1, o verbo começar deverá ir para a 3.ª pessoa do plural, concordando com o seu sujeito, que está no plural («os contornos da nova lei»): «Começam agora a desenhar-se os contornos da nova lei.»

TVI

«O título provisório da história, que está prevista estrear em Novembro na Globo.»

Errada esta construção.1 Trata-se de uma história, melhor dizendo, de uma «telenovela, cuja estreia está prevista para Novembro, na Globo».

A notícia referia o vídeo dado à estampa pelo jornal inglês The Sun, que retrata o  erro de dois pilotos norte-americanos, em 2003, no Iraque, provocando a morte de um soldado britânico:
«O vídeo mostra também o profundo desespero dos pilotos ao perceberem do erro cometido.»1

Perceber de significa «ser perito em», «ter bons conhecimentos sobre» (ex.: «Ele percebe de computadores»).

Aperceber-se de significa «dar-se conta de», «notar» (ex.: «Ele apercebeu-se de que o carro não tinha travões»).

«O meu sentimento, como é natural, é de um grande reconhecimento e de agradecimento à decisão que o senhor presidente da República tomou em querer-me agraciar.»1

Nesta frase há dois aspectos a considerar: primeiro, não se agradece a uma decisão, agradece-se a alguém; segundo, o pronome se deverá estar ligado ao verbo ao qual diz respeito (agraciar), e não ao auxiliar (querer).

Pergunta:

Não obstante o que aqui li de recomendação sobre o plural de cadáver, continuo o ouvir grande parte dos jornalistas da TV e da rádio portuguesas pronunciando-o com e fechado. Afinal, como é: "cadávres" (portanto, com e fechado) ou "cadávéres" (portanto, com e aberto)?

Resposta:

Deverá pronunciar-se com a vogal e aberta, como no singular. Não há nenhuma regra que determine que a vogal e mude de timbre quando o substantivo flexiona. A metafonia — mudança de timbre de uma vogal por influência de uma vogal posterior — está estudada nas gramáticas, nomeadamente a propósito, por exemplo, da abertura da vogal o do plural de algumas palavras como fogo ou povo, e não contempla a vogal e no plural dessa palavra.

O caso de cadáver (/cadáveres/) é idêntico ao de repórter (/repórteres/), éter (/éteres/), cárter (/cárteres/) ou líder (/lídères)/. Pode, ainda, fazer-se a analogia com Óscar (/Óscares/), dólar (/dólares/) ou díspar (/díspares/), palavras que mantêm a vogal a aberta no plural.