Maria Regina Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Diz-se  «os soldados que estavam encarregados da esquadra», como vi numa recente emissão do programa Cuidado com a Língua!, na RTP, ou, como creio ser a forma correcta, «os soldados que estavam encarregues da esquadra»?

Obrigado.

Resposta:

Na 20.ª emissão do programa de televisão Cuidado com a Língua!, foi utilizada – correctamente – a construção «eram encarregados» [«Deu-se este nome aos soldados que, pelas suas qualidades, eram encarregados do comando de uma esquadra, fazendo, como tal, serviço de cabos»], na explicação da origem da expressão «de cabo da esquadra».1

Embora o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa de Rebelo Gonçalves (1940) registe o termo encarregue, esta palavra é referida na Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira como pertencendo ao registo popular, não aparecendo na generalidade dos dicionários actuais. O seu uso é mesmo desaconselhado por autores como Vasco Botelho do Amaral (Grande Dicionário de Dificuldades e Subtilezas do Idioma Português, 1952), D'Silvas Filho (Prontuário Universal – Erros Corrigidos de Português, 1997) ou Edite Estrela (Saber Escrever, Saber Falar, 2004). Trata-se de uma forma eventualmente criada por analogia com entregue (de entregar).

Por outro lado, o particípio passado encarregado aparece referido no Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa (2001), com os seguintes exemplos: «Ficou encarregado de fazer o jantar para todos»; «Estava encarregado da organização do ficheiro.»

Está, pois, correcto dizer-se «eram encarregados» ou «estavam encarregados», tal como «tinham encarregado...

Pergunta:

No excelente  programa Cuidado com a Língua!, da RTP, numa explicação da mudança de sentido da palavra rival, pareceu-me ter ouvido (ou escutado) a locutora mencionar a palavra dantes, quando explicava o tempo da palavra acima referida. Será correcto?

Resposta:

No 11.º programa Cuidado com a Língua!, foi referido qual o significado do termo rival  «dantes» e «hoje», ou seja, antigamente e actualmente.

Está correcta a construção «dantes, rival significava… hoje, significa…».1

Efectivamente, emprega-se o advérbio de tempo dantes quando se pretende dizer «antigamente», «outrora», «antes de agora». Quanto ao advérbio antes, pode ser utilizado em diversas situações, das quais selecciono apenas a que diz respeito ao tempo: emprega-se antes quando se pretende situar algo entre um ponto e outro («anteriormente», «precedentemente», «previamente»).

Exemplos do emprego de dantes:
(1) Dantes, havia linha de caminho-de-ferro até Viseu; hoje, não há.
(2) Dantes, os alunos do Liceu D. João III em Coimbra usavam capa e batina; hoje, este vestuário é exclusivo de estudantes universitários.

Exemplos do emprego de antes:
(3) Compra, por favor, um pacote de arroz, mas, antes, passa pela farmácia, pois pode fechar.
(4) Não me recrimines: para compreenderes tudo o que fiz, tenho de te dizer o que se passou antes.

 

1 «Rival provém da palavra latina rivus, que significava rio... (…) Rivais eram os habitantes das margens do mesmo rio, do qual se serviam. Como o rio servia os habitantes de uma e de outra margem, eles estavam uns em frente dos outros e, por vezes, uns...

Pergunta:

Ao contrário do que aqui, no Ciberdúvidas se recomenda, tenho lido frequentemente, tanto nos jornais como até, nas legendas/traduções de filmes e séries, o por que separado interrogativas directas. Ainda há dias, lia-se esta chamada na primeira página do jornal Público: «Por que preferem as novelas portuguesas?»

Gostava de ver esta questão de novo esclarecida.

Muito obrigado.

Resposta:

É de facto muito vulgar esta incorrecção que consiste em utilizar por que em vez de porque nas frases interrogativas.

Três regras essenciais que talvez contribuam para um melhor esclarecimento:

1. Utiliza-se porque em geral nas frases interrogativas e, portanto, na expressão «porque é que».

2. Utiliza-se também porque nas orações causais («Fomos embora, porque se fazia tarde»).

3. Utiliza-se por que (preposição por e interrogativo ou relativo que) quando pode ser substituído por «por qual», «por quais», «pelo qual», «pela qual», «pelos quais», «pelas quais», ou seja, normalmente quando está presente na frase o substantivo a que o que se refere.

Exemplos de 1 (advérbio interrogativo), tirados de obras de alguns escritores:

1.1. Almeida Garrett (Viagens na Minha Terra, edição didáctica, Porto, Porto Editora, 1977)
a. Cap. XV, pág. 105
«– Como e porque deixava ele o mundo?»
b. Cap. XXIII, pág. 152
– «Joaninha, Joaninha, porque tens tu os olhos verdes?...»
1.2. Eça de Queirós (Os Maias, ed. Livros do Brasil)
a. pág. 196
«– Diz-me outra coisa. Porque não tens tu voltado aos Gouvarinhos?»
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