Maria Regina Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Gostaria de saber qual das frases abaixo está correta ou se ambas estão corretas.
Qual é o tempo verbal de cada uma?
"Eu fui uma criança muito feliz."
"Eu era uma criança muito feliz."
Em respostas anteriores encontrei explicação para "foi ou é", mas minha dúvida se refere ao uso no tempo passado em ambos os casos.
Grato.

Resposta:

Estão ambas correctas. São formas do verbo “ser”. “Fui” é a 1.ª pessoa do singular do Pretérito Perfeito Simples do Indicativo, e “era”, a 1.ª pessoa do singular do Pretérito Imperfeito do Indicativo.
A escolha de uma ou de outra tem que ver com a intenção de quem as utiliza.
Se pretender colocar a acção no passado em relação ao presente, deverá utilizar o Pretérito Perfeito (“fui”): “Penso que fui uma criança feliz.” O mesmo, se pretender relatar, narrar acontecimentos passados, em sequência: “Eu ri, brinquei, convivi, enfim, fui uma criança feliz.” O Pretérito Perfeito Simples indica uma acção que se produziu em certo momento do passado, uma acção completamente concluída.
Se pretender colocar a acção no passado em relação de simultaneidade com outro passado, deverá utilizar o Pretérito Imperfeito (“era”): “Quando o meu pai me contava histórias, eu era uma criança feliz.”; “Quando acampei pela primeira vez, eu era uma criança feliz.” Nesta época passada, está descrever-se o que era então presente. Com o Pretérito Imperfeito caracteriza-se, descreve-se, indica-se um facto contínuo ou permanente: “Olho para o passado e vejo bem como eu era feliz!”

Pergunta:

Tradição de ou tradição em?
E, se as duas formas forem possíveis, qual a diferença de significado entre elas?

Resposta:

Se pretende introduzir um determinativo, indicando de que tipo de tradição se trata ou a quem pertence, a preposição a utilizar é “de”: “a tradição da Bíblia”, “a tradição de fé”, “a tradição daquela família”, “a tradição dos nossos antepassados”, “a tradição do povo”, “a tradição de se comer arroz-doce nos casamentos”; “a tradição de se organizarem desfiles no Carnaval”, etc.
Poderá ocorrer uma ou outra situação em que surja a preposição “em” a seguir à palavra tradição, mas não propriamente regendo o substantivo: “é de respeitar a tradição em si, mas..”, “a tradição, naquela família, é muito respeitada”.
Como me apresenta a palavra descontextualizada, poderei não estar a ver todas as hipóteses em que está a pensar, pelo que, se quiser enviar uma frase em que tenha dúvidas, talvez o possa esclarecer melhor.

Pergunta:

Encontram-se casos de verbos intransitivos com um complemento direto.
Exemplos: sorri um sorriso; sonhei um sonho.
Tal período será considerado como de transitividade direta ou intransitividade excepcional com complemento direto.

Resposta:

Os exemplos que apresenta, assim, isolados, são pleonasmos. E os verbos estão conjugados transitivamente. Nestes exemplos, são verbos transitivos directos. O dicionário Novo Aurélio Século XXI (1999) apresenta exemplos da mesma situação: “Mal poderia sonhar tal calamidade”; “E reconto o passado, / No vago misticismo de quem sonha / Um sonho abandonado.” (Martins Fontes, Verão, p. 205); “Sorri um sorriso de satisfação”; “Minervino ficou sorrindo um sorriso triste.” (Nélson de Faria, Tiziu e Outras Estórias, p. 144).
Estes verbos são transitivos directos sempre que forem construídos com complemento directo.

Pergunta:

Qual a origem da palavra beto?

Resposta:

“Beto” é um provincianismo transmontano que designa uma espécie de pá de madeira com que se joga o toque-emboque (de tocar e embocar), jogo que consiste em fazer passar uma bola, impelida por uma pá, sob um arco espetado no terreno. Também se dá este nome a um jogo semelhante ao críquete, jogo inglês.
Na gíria do Porto, chama-se “beto” ao botão de casaco, designando essa palavra, também, o jogo do botão.

Pergunta:

"Mourinho começa hoje nas Antas às 8 da manhã e Mário Reis sucede-o em Leiria".
Está correcta (ou é admissível) a aplicação do reflexo "o"? O reflexo "lhe" seria o (ou o mais) correcto?
Obrigado.

Resposta:

Não, não está correcto o emprego do pronome “o”, que é um pronome pessoal, forma de complemento directo. O verbo suceder pede complemento introduzido pela preposição “a” (“Mário Reis sucede a Mourinho.”). Este complemento substitui-se pronominalmente pelo pronome pessoal forma de complemento indirecto “lhe”.
Os pronomes “o” e “lhe” não são pronomes reflexos. Os pronomes reflexos são: me, te, se, nos, vos, se.