Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Qual é a origem do nome Licínia?

Resposta:

É a forma feminina do nome Licínio, cuja etimologia José Pedro Machado, no seu Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, explica assim:

«Do lat[im] Licĭnĭu-, nome de família romana, na qual se distinguiram o orador C. Licinius Crassus e o triúnviro M. Licinus Crasus.»

Pergunta:

Em 2006, o Ciberdúvidas informou o seguinte:

«Pré-estabelecido e preestabelecido

[Pergunta] Tenho visto pelo menos três versões: pre-estabelecido (menos comum); pré-estabelecido; e um moderníssimo preestabelecido em documentos oficiais. Como devo escrever?

Aproveito para vos agradecer pelo vosso fantástico site. Tem sido preciosa a vossa ajuda!

Vanda Meneses Santos :: Professora :: Portugal

[Resposta] O prefixo tem duas formas: pré- (com hífen) e pre- (sem hífen). Poderia escrever-se pré-estabelecer, mas dicionários recentes (dois portugueses e um brasileiro, a saber, o Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, o Grande Dicionário da Porto Editora, e o Dicionário Houaiss) registam só preestabelecer. Deste modo, porque já há uma forma dicionarizada e porque a pergunta é relativa ao particípio passado deste verbo, recomendo preestabelecido.

Carlos Rocha :: 06/04/200»

Minhas considerações:

Eu já usava preestabelecido antes mesmo de encontrar a resposta acima, e é a forma que considero mais adequada, prática, moderna, sem mencionar que ainda iria mais longe: escreveria "prestabelecido" ...

Resposta:

Em primeiro lugar, deve saber que o prefixo tem duas formas: uma tónica, pré-, e outra átona, pre-. A forma átona ocorre em cultismos que há muito pertencem à língua, podendo o Dicionário Houaiss afirmar que «[...] é de presumir que, desses [cultismos], não poucos terão tido entrada como pré- (raro assim grafado), acentuação e abertura que logo desapareceriam com a frequência de uso da pal[avra] em causa; há, por conseguinte, uma forte relação de continuidade entre pré- e pre- [...].»   

Relativamente a preestabelecer, o novo acordo ortográfico não traz alteração: como disse na resposta em referência, a palavra inclui a forma átona do prefixo, a qual continuará a ligar-se à base da prefixação (estabelecer), sem hífen (ver 5.ª edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da Academia Brasileira de Letras). Note que "prestabelecer", com contracção da vogal do prefixo com a da base, não se encontra atestado; o mesmo acontece com palavras que apresentam o sufixo átono, p. ex., preexistir e não "prexistir".

Quanto à forma tónica do prefixo, pré-, à semelhança de pró- e pós-, ela mantém o hífen no quadro do novo acordo, conforme se pode ler na Base XVI, 1.º, alínea f):

«f) Nas formações com os prefixos tónicos/tônicos acentuado...

Pergunta:

Apenas para vos recomendar um novo termo a adicionar à língua portuguesa:

Hexacóptero.

Vede por favor:

http://vimeo.com/6194911

Atenciosamente.

Resposta:

Trata-se do aportuguesamento de um empréstimo proveniente do inglês, hexaKopter. Esta palavra é, além de uma designação comercial, uma amálgama, porque associa ao radical hexa- («seis») a forma -copter (grafada -kopter, talvez para reforçar o apelo comercial), obtida por uma análise incorrecta da palavra helicopter, uma vez que etimologicamente -copter não tem significação própria. Na verdade, helicopter tem origem no francês hélicoptère, que é formado por helic-, do grego helix, helikos («espiral»), uma vogal de ligação -o-, típica dos compostos de origem grega, e ainda o elemento ptère, também do grego pteron, «asa» (ver Online Etymology Dictionary e Dicionário Houaiss). O termo foi usado por Júlio Verne e pelos irmãos Wright, e foi popularizadoo pela invenção dos helicópteros nos anos 20 do século passado (Online Etymology Dictionary).

Pergunta:

Como posso apresentar o conceito de formas presas, livres e dependentes, utilizando como exemplos: a, de, que; azul, lei, luz; desfazer, predisposto, felizmente?

Grata pelo atenção.

Resposta:

Comecemos pela definição dos conceitos.  J. Mattoso Câmara Jr. (Princípios de Linguística Geral, Rio de Janeiro, Padrão-Livraria Editora, 1989, págs. 88) propõe três tipos de unidades significativas:

«[...] 1) forma presa, que só aparece ligada a outra e por ela condicionada; 2) forma dependente, que nunca aparece isolada, mas pode aparecer ligada a outra que não é aquela que a condiciona, quando entre ela e a sua condicionante se intercalam livremente outras formas; 3) forma livre, que aparece não raro isolada.»1

Mattoso considera que as formas livres e dependentes coincidem com os vocábulos. Digamos que a forma livre, que corresponde a um conceito difundido pelo linguista L. Blommfield (1887-1949), se identifica com o que se chama palavra lexical (principalmente substantivos; ver Dicionário Houaiss, s. v. palavra), enquanto uma forma dependente corresponde ao que outros linguistas designam como palavra funcional ou gramatical (sobretudo preposições e conjunções; ver ibid.). O conceito de forma presa, também popularizado por Bloomfield, opõe-se a forma livre e abrange afixos (ou seja, sobretudo prefixos e sufixos) e desinências (no caso do português, são verbais), isto é, trata-se de «qualquer unidade que não ocorre sozinha num enunciado, mas sempre presa a outra (p. ex.: o prefixo in- em infeliz; o sufixo -ndo em andando; o radical receb- de receber)» (ibid.).

Sendo assim, temos:

a, de<...

Pergunta:

Na terminologia especializada da odontologia, as próteses apoiadas sobre implantes são denominadas "implantossuportadas". Em boa parte dos artigos científicos, o termo encontra-se grafado com hífen: "implanto-suportadas". Qual é a forma correta?

Grata pela atenção.

Resposta:

Aconselho a forma implantossuportada, mas assinalo que se trata de um neologismo de aceitação discutível.

A palavra em análise baseia-se numa estrutura morfológica da língua inglesa: implant-supported. A respeito destes compostos, que pressupõem uma estrutura passiva («próteses que são apoiadas por implantes»), já nos referimos em outras ocasiões: não sendo uma estrutura frequente em português, parece ter visto um incremento por influência do inglês. Em todo o caso, a palavra apresenta o radical implant-, que ocorre também noutros termos como implantodontia, implantodôntico, implantodontista, implantologia, implantológico; a sua aceitabilidade é duvidosa justamente por se formar com um particípio passado (suportada, de suportar) ao qual se associa sem hífen o referido elemento, que corresponde a um agente da passiva ("implantossuportada" = suportada por implante). Tendo em conta os padrões tradicionais de formação de compostos, esta forma não é de recomendar; no entanto, reconheço que se trata de um novo padrão que do ponto de vista terminológico se torna bastante económico e, por isso, aceito o seu uso. Não obstante, para aqueles que vêem com reserva o novo termo, proponho o recurso a uma perífrase em que figura a estrutura passiva, menos sintética: «prótese suportada por implante».