Carlos Marinheiro - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Marinheiro
Carlos Marinheiro
180K

Carlos Marinheiro (1941–2022). Bacharel em Jornalismo pela Escola Superior de Meios de Comunicação Social de Lisboa e ex-coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa. Colaborou em vários jornais, sobretudo com textos de análise política e social, nomeadamente no Expresso, Público, Notícias da Amadora e no extinto Comércio do Funchal, influente órgão da Imprensa até ao 25 de Abril.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Gostaria que me indicassem se esta palavra, "ambiencial", existe ou não. Se não, a palavra ambiental será a correcta?

Grato desde já pela vossa atenção.

Resposta:

O Dicionário Eletrônico Houaiss não acolhe o adjectivo ambiencial, mas regista o substantivo (nome) ambiência, tratando-se de «qualidade do que é ambiente, do que rodeia os seres vivos» e «o meio físico, material, em que vive um animal ou um vegetal; meio ambiente»; por extensão de sentido, é «conjunto de condições sociais, culturais, morais etc. que cercam uma pessoa e nela podem influir; meio ambiente». Ambiência vem do «fr[ancês] ambiance (1885) "meio ambiente, atmosfera que envolve uma pessoa ou coisa"».

O adjectivo ambiental («relativo a ou próprio de ambiente») é correcto; naturalmente, no contexto adequado.

Pergunta:

O que significa a palavra composta treme-tremes?

Resposta:

O substantivo (nome) treme-treme quer dizer «tremor constante, ininterrupto». Na área das angiospermas, é o mesmo que capim-treme-treme ("designação comum") e flor-de-caboclo. Em entomologia, é o mesmo que bicho-pau (regionalismo do Brasil). Em ictiologia, e também regionalismo do Brasil, trata-se de «raia da fam[ília] dos narcinídeos (Narcine brasiliensis) do Atlântico, sendo encontrada ao longo da costa brasileira; de até 50 cm de comprimento, dorso acinzentado com manchas escuras alongadas de intensidades variáveis, ventre branco e órgãos elétricos nas expansões das nadadeiras peitorais; arraia-elétrica, narinari, raia-elétrica [Produz uma corrente elétrica de voltagem máxima entre 14 e 37 volts capaz de paralisar pequenas presas, crustáceos e moluscos]» ou do mesmo que «poraquê».

O Dicionário Eletrônico Houaiss atesta dois plurais: tremes-tremes e treme-tremes.

Pergunta:

Qual o significado da palavra compoteira?

Resposta:

Compoteira é um «recipiente côncavo, ger[almente] com pé e provido de tampa, onde se guardam e servem compotas, cremes, doces em pasta etc.» e, numa derivação por metonímia, «o conteúdo de uma compoteira» (ex.: «comeram uma compoteira inteira de morangos»).

[Fonte: Dicionário Eletrônico Houaiss]

Pergunta:

Que explicação haverá para esta comparação tão usada? Que pilha será esta?

Resposta:

Naturalmente, é uma pilha de sal. O Dicionário Prático de Locuções e Expressões Correntes, de Emanuel de Moura Correia e Persília de Melim Teixeira, edição da Papiro Editora, diz que «estar muito salgado» quer dizer «estar como uma pilha de sal»; e, em seguida, considera que «salgado como pilha» significa «excessivamente salgado».

Pergunta:

No jornal Correio da Manhã de 19/10/2009 e a propósito de um acidente mortal, escreve-se: «Mas, quando se preparava para colocar as manilhas da conduta de água, num buraco com mais de seis metros de altura, João Ramos foi atingido por um desmoronamento de terras.»

A pergunta é: um buraco tem altura, ou tem profundidade?

Resposta:

Visto de cima, tem profundidade, mas «João Ramos foi atingido por um desmoronamento de terras»; significa isto que ele se encontrava no fundo do buraco. Assim, nesta situação, está correcto falar em altura (do buraco).1 Naturalmente, a altura e a profundidade são do mesmo tamanho, no entanto, se uma pessoa estiver à beira do buraco, deve dizer «este buraco tem seis metros de profundidade»; se se encontrar no fundo dele, é preferível que diga «este buraco tem seis metros de altura».

1 Mesmo que se considere absurda a inferência «alguém está no fundo de um buraco muito alto», porque as noções de fundo e alto se opõem, a verdade é que o termo altura se aplica paradoxalmente à profundidade de um poço, como se verifica no Dicionário Houaiss, que, para esta palavra, atesta, entre outras acepções, a de «nível de profundidade; fundura» («a altura de um poço»). Se um poço tem altura, então é também possível dizer que, pelo menos de um determinado ponto de vista, um buraco também tem altura.