A propósito de palavras que acabam em -s no singular (como lápis e pires), o professor e jornalista angolano Edno Pimentel alerta para os cuidados a ter com as regras que definem a relação entre o singular e o plural de substantivos e adjetivos. Crónica publicada no jornal luandense Nova Gazeta em 30/07/2015, à volta dos usos do português em Angola.
O problema é exactamente esse: pensar que todas as palavras em português terminadas em -s estão no plural. Foi por isso que os dois meninos, pobres inocentes, queriam comprar apenas «um lápi».
Mas eles não foram os únicos. Já há muito, numa barraca do B.O, enquanto apreciava um torresmo ajindungado com um saboroso Herdade do Peso, uma linda jovem também pediu «um pir de moelas» – acho ter sido isso que ouvi.
Recentemente voltou a acontecer, mas, desta vez, não foram crianças. Enquanto almoçava à beira-mar, o companheiro de mesa precisava de um “pir” com feijão de óleo de palma. Como eu acenei a pedir também por um, o jovem adiantou-se: ao invés de um, traz já dois pires de feijão.”
Não é difícil concluir que o problema, apesar de ser de número, não é uma questão de matemática, que muitos temem, mas, sim, gramatical. Da flexão de número (plural/singular) dos substantivos.
Regra geral, forma-se o plural acrescentando um -s ao nome: mãe – mães; mão – mãos; casa – casas; aluna – alunas. Algumas palavras exigem alguma atenção: homem – homens; leão – leões. Outras exigem mais: fácil – fáceis; par – pares; mal – males; perdiz – perdizes.
Há ainda aquelas palavras que exigem muito mais atenção, porque, às vezes, se encontram num estado em que, só com um determinante/artigo ou numeral é que nos podemos informar se estão no plural ou singular. Lápis e pires são algumas dessas palavras. Fora de um contexto, não é possível determinar o seu número gramatical. Ou seja, lápis e pires podem tanto estar no plural ou no singular, dependendo do que aparece antes. Pode-se dizer «quero apenas um lápis» ou «quero dois lápis»; «sirva-me um pires de feijão» ou «sirva-me três pires de feijão».
Crónica da autoria de Edno Pimentel e publicada na coluna "Professor Ferrão" do jornal luandense "Nova Gazeta", em 30/07/2015. Manteve-se a ortografia conforme a norma ainda aplicada em Angola, a qual é anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.