Uma reflexão do autor em torno da utilização na imprensa portuguesa do adjetivo ambíguo, em crónica de Wilton Fonseca, no jornal i de 18 de abril de 2013.
Vários jornalistas [portugueses] afirmaram que Pires de Lima, ao reclamar uma remodelação mais profunda do governo, havia assumido a atitude «ambígua» do CDS em relação ao seu parceiro de coligação.
Ambiguidade é o estado ou a qualidade daquilo que tem mais de um sentido; é uma dúvida, uma indefinição, uma incerteza; pode residir numa sequência de frases, numa frase, numa palavra ou até mesmo num fonema, mas contamina todo o contexto em que se encontra inserida.
As gramáticas geralmente consideram a ambiguidade um defeito ou um vício. Atribuem ao falante a culpa pela produção e utilização do elemento que dá origem a mais de uma interpretação. Na génese da ambiguidade estaria um processo mental confuso ou pouco claro.
Há também quem procure explicar a ambiguidade utilizando um outro argumento: sendo finito o número de fonemas, de sílabas, de palavras e de frases, a existência de qualquer tipo de hesitação (do falante, evidentemente) no processo de produção de qualquer desses elementos pode ter como resultado uma sequência susceptível de ser interpretada de mais de uma maneira (pelo ouvinte ou pelo consumidor da informação), sobretudo se forem tidos em conta os diferentes contextos em que os enunciados em causa podem surgir.
Longe de constituir um defeito ou um vício, a ambiguidade seria assim uma fatalidade, um fenómeno comum a todas as línguas naturais, uma característica básica e inevitável. Tão básica e inevitável como as divergências que separam o CDS do PSD.
In jornal i, de 18 de abril de 2013, na crónica semanal do autor, "Ponto do i", com o título original "Ambiguidade". Respeitou-se a antiga ortografia, seguida pelo jornal.